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final fantasy 7 (ps & al.)

SUPER-REVIEW n. 17 DO RAFAZARDLY/0LDBUTG8LD

Por Rafael “Cila” Aguiar

PlayStation

+ Android, PC, iOS, PlayStation4, Switch & XONE.

Final Fantasy VII

F I C H A    T É C N I C A
Developer(s)
SquareSoft, Square Enix
Publisher(s)
Square (PS, JP), Sony (PS, EUA/EUR), Eidos (PC, EUA/EUR), Electronic Arts (PC, Ásia), Square Enix (AND, iOS, PS4, SWI, XONE)
Estilo(s)
Role Playing Game
DATA(S) E REGIÃO(ÕES) DE LANÇAMENTO
PS
31/01/97 (JP), 07/09/97 (EUA), 20/09/97 (EUA, Rerelease), 02/10/97 (JP, International version), 17/11/97 (EUR), 1998 (EUR, Platinum), 27/03/00 (EUA, Greatest Hits), 20/12/01 (JP, PSOne Books), 20/07/06 (JP, Ultimate Hits)
PC
31/05/98 (EUA), 25/06/98 (EUR), 1998 (Ásia), 14/08/12 (EUA/EUR, Online version), 16/05/13 (JP, Online version), 04/07/13 (EUA, Steam)
iOS
20/08/15 (EUA/JP)
AND
07/06/16 (EUA)
PS4
05/12/15 (EUA/EUR/OCE), 06/12/15 (JP/Ásia/COR)
XONE
26/03/19 (mundial)
SWI
26/03/19 (EUA/EUR/JP/COR), 16/08/24 (EUR, edição física especial Code in a Box)

Também incluso na(s) compilação(ões):

PlayStation Classic

Quem jogar este também poderá gostar de:

(Em vermelho, os jogos que já revisamos – se não estiver linkado, ainda não foi “upado” no novo blog.)

Final Fantasy IX (AND/iOS/PC/PS/PS4/SWI/XONE)

Final Fantasy VI (AND/GBA/iOS/PC/PS/PS4/SNES/SWI/XSX)

Final Fantasy VII Remake (PS4)

Final Fantasy VIII (AND/iOS/PC/PS/PS4/SWI/XONE)

Final Fantasy X (PS2/VITA)

Grandia (PC/PS/PS4/PS5/SAT)

The Legend of Dragoon (PS/PS4/PS5)

Legend of Legaia (PS)

Star Ocean: The 2nd Story (PC/PS3/PS4/PS5/PSP/SWI/VITA)

Xenogears (PS)

NOTA(S)

(Cada escore é uma média dos principais portais de games na web e revistas antigas quando for o caso, e também engloba a opinião dos gamers visitantes, além da crítica especializada; não necessariamente reflete meu ponto de vista sobre o jogo.)

8.9 (PS) | 8.8 (PC) | 8.2 (AND) | 8.3 (iOS) | 8.6 (PS4) | 8.5 (XONE) | 8.6 (SWI)

ESTE JOGO É PRA…
(X) passar longe(X) dar uma jogadinha de leve
(X) dar uma boa jogada(X) jogar freneticamente
(   ) chamar a rua toda pra jogar(X) uma incógnita
(  ) tipos específicos de jogador. Quais? 
FAIXA DE VIDA ÚTIL ESTIMADADe 56h a 69h.

Um dos jogos mais influentes de todos os tempos. Na década de 20, recebeu dois remakes, e ainda receberá outro. Até 1996, a SquareSoft havia lançado quase um Final Fantasy por ano. Poucos elementos havia em comum entre cada novo título numerado da saga, incluindo um personagem invariavelmente chamado Cid: gráficos 2D, batalhas em turno e ambiente medieval. Final Fantasy VII seria o primeiro grande corte ou revolução, adotando polígonos, batalhas ainda em turno mas com um aprofundamento do sistema ATB de FF6 e a ambientação de um cyber-thriller.

O uso de fundos pré-renderizados possibilitaria à Square criar backgrounds verdadeiramente detalhados sem roubar tanto espaço de cada CD-ROM. FF7 consagraria esse tipo de gráficos, que ainda seriam usados à exaustão até FF10 no PlayStation2. Os modelos dos personagens, na outra mão, considerados primitivos até na época, são vistos hoje com certa nostalgia, e como excelente veículo de aspectos emotivos da narrativa, como personagens de uma ópera-bufa ou do cinema mudo, intencionalmente caricatos em seus gestos superexcitados. Mesmo pequenos detalhes como animações de caminhada e corrida foram lembrados pelos programadores, e podem-se testemunhar fragmentos da personalidade de cada playable character (PC) através dessas rotinas.

Esq.: Final Fantasy VII (1997); dir.: Final Fantasy VII Remake (2020).

Outra faceta gráfica de ponta para a época, além dos fundos pré-renderizados, eram as cutscenes em computer graphics (CGs), nicho no qual a SquareSoft se tornou notável especialista no fim dos anos 90. Passou a incluir cada vez mais minutos animados dessa maneira entre as seções do jogo, ajudando a tornar o gênero do jogo eletrônico muito mais cinemático, embora nem de perto chegasse à extravagância de um Metal Gear Solid. Ainda assim, os jogos da Square com essa tendência mais proeminente não incluem, ainda, FF7: Parasite Eve, Xenogears e Final Fantasy VIII.

Final Fantasy VII usa fundos de tela pré-renderizados… o que ajuda a entender por que esse recurso praticamente morreu com o Dreamcast!

O jogo começa com um campo de estrelas brilhando e em seguida dando fade out lentamente, à medida que um rosto humano surge na tela: Aerith. Uma mulher trajada com roupas clássicas, que não a situariam necessariamente num ambiente urbano ou futurista, carregando uma cesta e caminhando de um beco até a rua mais movimentada – agora a câmera, se afastando, revela a ambientação noturna da cidade grande. E a câmera não pára mais de se afastar até revelar toda a magnificência de dita cidade, Midgar, palco das primeiras horas de exploração em FF7. O título aparece na tela e a câmera finalmente dá zoom outra vez, num outro setor da cidade, em que um trem pára e alguns sujeitos excêntricos descem. O último deles uma espécie de loiro acrobata, dando um supérfluo salto mortal a partir do topo do veículo, caindo com perfeição no solo. Este é Cloud Strife, o primeiro de todos os personagens selecionáveis e protagonista da trama. A transição da CG para os primeiros quadros jogáveis é como que repentina e no entanto sem ser abrupta ou brusca, inaugurando uma certa técnica de transitar naturalmente entre os dois meios que a Square refinaria ainda mais em seu Final Fantasy VIII. Essa seqüência é tão famosa que o remake se sentiu obrigado a iniciar reproduzindo-a.

Àquela idade dos gráficos de computador nem mesmo os olhos eram ainda animados com polígonos, não passando de imagens 2D imóveis superimpostas aos rústicos modelos 3D. Toy Story, que emocionou muitas pessoas com sua estória e sua tecnologia de animação, havia saído, afinal, em 1995.

Muitos consideram Final Fantasy VII o primeiro AAA game da História, havendo custado 40 milhões em dólares americanos de 1997, exigindo uma equipe de duas centenas de pessoas dedicando-se exclusivamente por cerca de 24 meses. Hoje em dia esse aspecto envelheceu mal, mas o que pode ter vendido muitas cópias do jogo são suas batalhas animadas em 3 dimensões, sem o uso dos backgrounds fixos em alta resolução. Acontece que para a época era algo completamente inusitado: até Final Fantasy VI as telas de batalhas em turnos eram semi-estáticas, na comparação, muito embora FF6 já tenha incorporado muitos detalhes e movimentos inexistentes em Final Fantasy I: quase sempre se tratava do estereótipo dos inimigos à esquerda e os mocinhos à direita, vistos de perfil, com a tela cheia de números. Como os golpes eram mostrados com poucos segundos de intervalo em relação aos comandos, FF7 haveria de gerar muitas expressões abismadas e boquiabertas com o salto tecnológico proporcionado em tão pouco tempo. As mudanças de câmera constantes dinamizavam em muito a experiência, razão pela qual a Square preferiu não renderizar os fundos bidimensionalmente nessas ocasiões.

Os fundos pré-renderizados são impressionantes, mas navegar por eles pode ser um tanto inconveniente. Como os ângulos de câmera são fixos, eles podem causar confusão quando se modificam, de uma tela estática para a seguinte, originando, ainda, enganos de perspectiva para o olho humano. É necessário ajustar os controles vetoriais de tela para tela, o que pode desorientar a princípio. Só com tentativa e erro descobre-se quais partes do cenário são interativas e quais não o são. O fato de haver um sistema de flechas ou setas piscando em cores fáceis de visualizar, em 2D, que indicasse os locais de saída ou entrada na tela, conota que as telas são confusas, e havia a necessidade de uma ferramenta auxiliadora.

Nos combates, uma das grandes inovações foi o implemento das materias. As materias são a base do sistema de magia e de poderes elementais, permitindo grande flexibilidade entre os personagens, evitando, ainda, a formação de classes de origem entre os personagens, que estariam fadados a lutar desta ou de outra forma, se bem que personagens como Aerith sempre são mais fortes defendendo do que atacando (por conta dos limit breaks). Mesmo convocações são realizadas via uso de materias. O segredo está em limitar o número de materias equipáveis a cada momento da gameplay. Materias podem aumentar de nível exatamente como os próprios personagens. A determinado nível novas habilidades são destravadas. O que talvez limite o potencial das materias é a dificuldade do jogo, considerada baixa. Mesmo jogando ao acaso, sem usar combinações ótimas de materias (combos) para o melhor efeito, é possível zerar o jogo tranqüilamente.

A TRAMA ATRAVÉS DE SEUS PERSONAGENS

Voltemos ao fim do parágrafo que diz: Essa seqüência é tão famosa que o remake se sentiu obrigado a iniciar reproduzindo-a. Continuemos a partir daqui para analisarmos o enredo. “Vamos lá, novato, me siga.”, é a primeira linha de diálogo do jogo, direcionada ao jogador pelo (por enquanto) NPC (e já, já PC) Barret. Em instantes a primeira batalha sucede, contra guardas fracos. Há duas opções de início, ataque e magia, mas usar magia nesse momento nem sequer é recomendado.

Posteriormente, noutro diálogo, ao se apresentar, o protagonista anódino cita pela 1ª vez seu nome on-screen (você pode editar o campo, mas seguindo o padrão ele é Cloud). Cloud é um ex-SOLDIER, espécie de grande exército privado ou milícia de uma grande corporação “de fachada” desse mundo (Shinra), atual mercenário, que luta por dinheiro. Seu cliente atual se chama Avalanche, um grupo terrorista que está justamente invadindo uma base da Shinra para explodir um reator de energia, que neste mundo usa mako, a força vital da terra. Sugar o mako para criar energia elétrica significa literalmente o assassínio lento (mas nem tanto) e seguro do planeta.

Após o sucesso da primeira missão, novos elementos do story-telling são introduzidos: aprendemos que Barret é na verdade o pai exemplar de uma garotinha de seus 6 anos de idade no tempo livre, Marlene; que a sede clandestina da Avalanche é no subsolo do bar de Tifa, amiga de infância de Cloud, que o reencontrou faz pouco tempo, e por isso ele está executando o trabalho atual; finalmente, encontramos Aerith, a garota da seqüência de entrada, uma Cetra remanescente, civilização remota e quase extinta com poderes especiais ligados ao mako. Em cutscenes, tomamos conhecimento do presidente e outros cargos de autoridade da Shinra, reagindo ao ataque. Depois também conhecemos Hojo, um cientista sem ética, provavelmente uma das figuras mais diabólicas do mundo dos games. Neste primeiro arco de Final Fantasy VII somos também apresentados ao nome Sephiroth, uma espécie de figura mítica, mas não somos bombardeados com muitos detalhes, embora seja ele, ao cabo, o arqui-vilão da estória.

O mako é uma energia tangível que é compartilhada por todos os seres vivos. As correntes de mako se comunicavam com os Cetras. Hoje a humanidade perdeu o dom de entender sua própria essência. Tudo está conectado, e não morremos literalmente, pois nossas partículas de mako estarão sempre integradas ao planeta para reviver em outras criaturas, a menos que mais usinas de energia de mako proliferem, o que causará um déficit irreversível. Qualquer semelhança com a história do petróleo é mera coincidência!

Obviamente, como é um RPG, o enredo é um tanto mais drástico: mako interagindo diretamente, em grandes quantidades, com seres humanos causa mutações que causariam inveja a nossos elementos radioativos. Há pessoas que se converteram em monstros graças a acidentes. Seja como for, no caso de Midgar os ricos moram em cima, numa cidade luxuosa, enquanto os pobres moram embaixo, nas favelas, separadas por estruturas metálicas do “mundo dos patrões”, confinados em lugares mal-iluminados, sem esgoto, sem condições de vida palatáveis. Os suspensos nas plataformas da megalópole possuem “tudo”. Iremos nos aprofundar nos arcos individuais dos protagonistas, quase sempre provindos de ambientes traumáticos, como forma de aprofundarmo-nos no enredo:

Barret Wallace chama nossa atenção de imediato pelo character design, e suas primeiras linhas de diálogo não dissuadem essa primeira impressão óbvia. Barret tem 2m de altura e uns 130kg de muito músculo e pouca gordura. É um homem negro com nada menos que uma machine gun acoplada ao próprio braço direito. Se fosse um filme hollywoodiano, seria aquele cara de poucas mas marcantes palavras que faz o serviço sujo direito e deixa o crédito para o mocinho branco. É um estereótipo tão fácil de identificar que as acusações de que a Square o modelou de forma racista são numerosas. Afinal, por que caracterizar o único negro da equipe controlável como brigão, de pavio curto, um pouco tartamudo em seus discursos (fala sem pensar, emite muitos palavrões, às vezes corta algumas sílabas), aparência reminiscente do Mr. T. (só entenderão a referência os apreciadores da sétima arte anos 80)? Porém, como em todo bom RPG Barret não é um ser estático, e possui um arco, no qual se desenvolve, o que derruba todas essas acusações precoces e arrogantes.

Inicialmente Barret é o contraponto do protagonista número 1, isto é, Cloud, e na primeira missão ambos não conseguem se entender mesmo que estejam trabalhando juntos. Barret exibe preocupações ecológicas. Cloud não tem tempo para perder com hippies com basicamente o dobro do seu peso. É batalhando juntos contra o primeiro boss que Cloud e Barret começam a se aproximar, ainda que de modo infinitesimal. Talvez os videogames sejam privilegiados em relação a qualquer outra arte, porque permitem que o receptor participe desse processo. Só num game seria possível estabelecer uma relação que cresce paulatinamente entre um mercenário e sua parceira muda, por exemplo. Um filme poderia fazê-lo, mas não tão bem. Esse é um exemplo mais recente que o jogo que analisamos agora, Metal Gear V (Snake e Quiet). Desde 1997 os games caminharam muito, se aproximando mais e mais do cinema; entretanto, há a barreira da gameplay, que impede a fusão dessas duas mídias; cremos que isso depõe a favor dos jogos eletrônicos e contra os filmes na hora da projeção e identificação com papéis. Parte da empatia que criamos por personagens interativos vem, é claro, do montante de tempo que dedicamos a eles. Trinta, cinqüenta horas é muito diferente de duas. Uma série teria de ser muito longa se pensa em rivalizar com o carisma dos protagonistas de Final Fantasy VII.

Depois de ambos, Cloud e Barret, salvarem a vida um do outro incontáveis vezes será muito mais convincente perceber o quanto cada um confia bem mais no antigo parceiro antipático, sem nenhuma forçação de barra. Seja como for, a primeira vez que vemos um outro lado em Barret é após a primeira missão, quando descobrimos que ele é pai solteiro e coruja de uma menininha, Marlene.

Um grande momento no arco de Barret se dá de 10 a 15 horas após o começo da gameplay. Quando o time do jogador chega a Corel, a cidade natal de Barret, chega o momento de desvendarmos seu passado. O vilarejo é bem pobre – talvez mais pobre que as favelas de Midgar. Assim que Barret aparece na cidade é socado por um morador, sem sequer uma troca de palavras. Todos começam a culpá-lo pelo atual estado do local. Barret, a fim de esclarecer o grupo da recepção maldosa, conta a situação irônica e trágica na qual esteve envolvido: ele mesmo já foi um defensor das usinas de mako. Possuindo uma economia dedicada à extração de minérios, Barret militou pela adesão aos reatores, que seriam a salvação econômica do lugar. Ele convenceu seu então melhor amigo, Dyne, da superioridade da exploração da energia natural. Um acidente pouco tempo depois fez com que a Shinra culpasse os locais, e um exército foi enviado para destruir o que restava de Corel em represália, e para abafar o caso. Dyne e Barret estavam ausentes e chegaram com a cidade em chamas. Foi nessas circunstâncias que Dyne caiu num precipício e Barret perdeu seu braço esquerdo. O ódio de Barret pela Shinra começou aí. E com todo o ódio vem a imensa culpa de ter acreditado no projeto que hoje ele condena com veemência. O “grosseirão da bazuca” já está muito mais humanizado a nossos olhos.

O próximo passo é um reencontro com Dyne, que não morrera àquele dia. A única semelhança entre os dois antigos companheiros é que Dyne também odeia a Shinra. Mas o contexto do reencontro é inteiramente problemático: em vez de formar um grupo terrorista, Dyne mergulhou no niilismo profundo. Sua vingança foi direcionada para o mundo inteiro, incluindo os inocentes. Havendo perdido sua esposa e sua filha, Dyne não crê mais em qualquer possibilidade de redenção. Ambos acabam resolvendo suas diferenças inconciliáveis num duelo, já que palavras não bastam, uma rara oportunidade em que o RPGista controlará apenas um membro da equipe num 1×1. A grande surpresa é que Marlene é a filha biológica de Dyne, que ele pensou que havia perdido. Mesmo sendo informado de que sua filha ainda vive, Dyne diz que deve matar Marlene, para que ela reencontre a mãe, e esta é a deixa para o confronto dos dois homens. Barret ganha sem precisar matar Dyne e refaz sua proposta para que ele se junte ao grupo Avalanche e volte a Midgar para rever sua filha. Um resto intocado de bom senso no coração de Dyne cintila e ele se arrepende de seus atos. Incapaz, todavia, de suportar a culpa, ele se joga no abismo. Barret está moralmente destruído a essa altura.

Uma falha no FF7 da Steam é que os comandos nos tutoriais continuaram atrelados às velhas teclas do joystick de PSOne

Quem simpatizou com a crise de identidade do revolucionário Barret terá ainda mais motivos para gostar do background de Red XIII, talvez o mais inusitado dos membros do bando, tirando Cait Sith. Visualmente, ele é uma espécie de leão-cão híbrido e falante, o último de sua linhagem. Ele é introduzido no fim do primeiro terço de jogo, a “seção Midgar”. Ele é prisioneiro de um cientista maluco, Hojo, que pretende estabelecer, para seus interesses próprios, o cruzamento dessa besta com uma humanóide chamada Aerith, também última de sua raça. Os heróis da trama felizmente chegam antes dessa abominação acontecer, e Red aceita ajudar o grupo de intrusos, apesar de “não gostar de bípedes”. Ele aceita participar da equipe até que atinjam Cosmo Canyon, sua terra natal.

Red XIII possui uma longa estimativa de vida. Sendo assim, apesar de ser de longe o mais velho do elenco controlável, com 48 anos, ele é apenas um adolescente. Ainda assim, ele é bastante sábio e possui um jargão erudito, além de cicatrizes que demarcam sua experiência como guerreiro. Red tem vergonha de seu pai, que teria fugido durante uma guerra, aquela que quase exterminou seu clã. Todos os personagens do jogo podem ser renomeados à vontade pelo jogador assim que entram para a equipe, menos Red XIII (na versão original de PSX) – a propósito, essa não é sua alcunha de batismo, apenas a denominação que Hojo escolheu para seu “objeto de estudo”. O verdadeiro nome de Red só é revelado assim que a Avalanche chega a Cosmo Canyon: Nanaki.

Nessa paragem o grupo conhece Bugenhagen, o avô adotivo de Nanaki/Red, um humano idoso. Bugenhagen é como que o antípoda de Hojo, um cientista aposentado da Shinra que coloca a ética acima da curiosidade vil e antevê o dia em que a extração de mako terminará de arruinar a vida no planeta. Baseada no mundo real, Cosmo Canyon funciona à base de energias renováveis como o vento e o sol. Na dungeon explorável nesse segmento da narrativa, Bugenhagen leva o grupo para cavernas onde Nanaki finalmente aprende que seu pai não fôra um desertor de guerra, mas um herói que se sacrificou para obstruir a entrada ao santuário da raça. Seu corpo sobreviveu empedrado e ainda homenageia o espírito bélico da espécie, bem como espanta possíveis invasores contemporâneos. Red XIII deixa a vergonha familial de lado e passa a exortar sua árvore genealógica e seu nome de guerra Nanaki a partir de então, optando por continuar com a Avalanche para salvar a Terra.

Cait Sith, o próximo em nossa lista, é um personagem polêmico e possivelmente o menos bem-explorado de todos. Destoando da maioria, Cait é bonitinho e fofinho, e na verdade é dual: trata-se de um gato sobre uma armadura de moogle, uma espécie comum nos jogos Final Fantasy. Tampouco é explicado como este gato fala, o que era considerado anormal para Red XIII. Não obstante, havia, para esse último, a explicação de que assim funciona sua raça, o que não se repete para Cait. Em resumo, Cait Sith é um modelo bastante kitsch em contraste com seus demais colegas. Ele é encontrado praticando a adivinhação no maior centro de entretenimento (cassino e parque de diversões num só lugar) do planeta, Gold Saucer. Após ler sua fortuna de graça (que em verdade prevê vários pontos da narrativa de forma críptica), Cait decide se juntar à trupe do jogador. Ele acha que seu futuro é nebuloso, e que a única forma de se tranqüilizar a respeito é vivenciando por si mesmo tais eventos. Por mais que Cloud e os outros protestem, Cait se une ao grupo ainda assim!

Na seqüência descobre-se que Cait era apenas uma marionete controlada por Reeve, da Shinra, para espionar seu grupo. Ao adquirir certo item relevante, Cait o rouba e entrega à corporação. Em seguida ele revela que detém Marlene como refém, exigindo a cooperação de todos. Seqüestrar uma criança não é um delito leve, ainda mais num game que não é só para maiores de idade. Óbvio que, considerando que se trata de um personagem controlável, deveria haver um arco de redenção, e é o que efetivamente sucede. Com o decorrer da estória, Cait se revela um agente duplo, transmitindo a Cloud, Barret e os outros, por sua vez, segredos industriais de seus patrões. O fim dos bons atos de Cait, pelo menos os de relevo, se dá ainda no disco 1 de FF7, no Templo dos Antigos. Ele se sacrifica para salvar os amigos de morrerem soterrados – e volta à vida como Cait Sith 2, porque era só um robô (sensciente) e pode ser reconstruído, assim como o moogle é só um bicho estofado que ganha uma alma. Quando “renasce”, Cait Sith se torna finalmente livre e um membro confiável da Avalanche.

Cid Highwind é o último personagem jogável introduzido, após cerca de 25h de jogo. Um homem que já passou da meia-idade, ele é o catalisador de vários eventos fulcrais para o story-telling. Mora em Rocket Town, uma vila pequena que já participou de um antigo programa de exploração espacial da Shinra. Cid é o que este universo narrativo chamaria de astronauta, se o termo já existisse. Mas o projeto foi cancelado de última hora e este homem jamais pôde realizar seu sonho de evadir a estratosfera. Cid culpa sua assistente Shera por não ter executado certa checagem de cilindros a contento, o que causou uma falha crítica no dia do esperado lançamento do foguete. Isso tornou este personagem bastante amargo com a vida, sempre disposto a espremer seu fel em direção à mesma Shera. Cid é consideravelmente polêmico dado o histórico de bullying, assédio, toxicidade e machismo que ele traz consigo.

De um jeito grosseiro ele consegue ser engraçado, faz média com o público beberrão e fumante e também com os bocas-sujas de plantão. Nada disso apaga seus defeitos, mas ao menos Cid tem sua redenção, como todos os outros personagens selecionáveis: em um ponto da estória, Cloud e os outros precisam usar o foguete, que é ressuscitado. Quando um dos cilindros de oxigênio explode, prendendo Cid no lugar, ele aprende que a lenta inspeção de Shera, que havia demorado até o instante do lançamento e forçado seu aborto, tinha muita razão de ser, isto é, ela tinha razão esse tempo todo. A partir daí Cid se torna mais compassivo e compreensivo, mais afável com Shera, inclusive prometendo pedir-lhe a mão, depois de salvar o mundo com a Avalanche, claro.

Yuffie Kisaragi e Vincent são alguns dos personagens mais celebrados e reconhecidos do universo de FF7. Yuffie talvez seja ainda mais reconhecida por sua aparição em Kingdom Hearts. Vincent recebeu até seu próprio jogo spin-off. Em Final Fantasy VII ambos são personagens optativos. Um jogador menos atento pode zerar o RPG sem entrar em contato com ambos. Como com todos os personagens neste formato, obviamente que a importância do arco individual de qualquer um dos dois é relativa, não incidindo diretamente nos eventos centrais da narrativa, ou ela seria prejudicada. Não obstante, há valia em seus backgrounds e o lore do jogo é deveras enriquecido por suas presenças.

Yuffie não passa de uma adolescente de um clã ninja. Só há uma forma de dar-lhe as boas-vindas ao grupo: derrotando-a num confronto pseudo-aleatório na floresta e respondendo corretamente a um interrogatório. Ela é serelepe, irascível e enérgica. Através de Yuffie ficamos por dentro de um evento sempre discutido nas margens, nunca mostrado em suas cores: a Guerra de Wu-Tai contra a Shinra, um evento de proporções calamitosas nesse mundo, quase que uma Guerra Mundial. Wu-Tai é uma nação fortemente inspirada no Japão. A tal guerra ocorreu quinze anos antes da estória do próprio FF7. Nela, Wu-Tai foi vergonhosamente derrotada, emulando a situação do império japonês na Segunda Guerra Mundial e a decadência do estilo de vida samurai. A semelhança do mako com energia nuclear só ajuda a aumentar os paralelos até graus indisfarçáveis. Como punição pela perda da guerra, o território de Wu-Tai não ganhou uma usina de mako, recebendo com isso duros reveses econômicos numa situação em que a Shinra já exercia basicamente um domínio totalitário no globo. Apesar de ser um destruidor do meio ambiente, está claro que a ausência de mako numa região pode gerar miséria, fome, milhões de sofredores, complexificando a questão. Godo, pai de Yuffie e o líder de Wu-Tai, transformou o local num destino turístico para revigorar as finanças. Yuffie é contrária a essa “prostituição da forma tradicional de vida de seus ancestrais”. É nessa rixa familiar-nacional que o jogador meterá o nariz num dos arcos facultativos do jogo. Ocorre que passando por Wutai a determinada altura o grupo acaba deixando-se roubar pela garota, perdendo temporariamente todas as materias até reencontrá-la posteriormente. É revelado que o intuito de Yuffie ao roubar materias não era se beneficiar egolatramente, mas tentar armar seu país e fortalecê-lo. Pueril ao se pensar que uma adolescente pudesse fazer uma diferença de grande escala, mas sem dúvida enriquecedor do lore. Yuffie é, em suma, a “representante de minorias” por excelência.

Finalmente chegamos a Vincent, o segundo personagem inteiramente opcional. Porém isso é enganador: a estória por trás deste homem é até vital para o entendimento do game como um todo, preenchendo lacunas e buracos também da biografia de antagonistas, incluindo Sephiroth. É quase um pecado que esse segmento possa ser evitado. Contudo, houve reparações históricas, como o lançamento de um spin-off inteiramente protagonizado por Vincent, e que nem é um RPG! Vincent era um turk, não um turco, na tradução, mas um dos espiões treinados pela Shinra. Um dos deveres dos turks é achar novos recrutas para os Soldiers. Durante seu jogo, quatro turks antagonizarão o time protagonista em diversas passagens. Quanto a Vincent, ele é uma espécie de semi-vampiro (dampiro) condenado à imortalidade. Seguindo o estereótipo, o personagem será encontrado adormecido num caixão. A questão crucial aqui é: como e por que V. foi parar ali.

Trinta anos atrás Vincent era o segurança de vários cientistas figurões da Shinra, incluindo Hojo, então em início de carreira, seu chefe de departamento Gast e Lucretia. Quem for versado em mitologia grega e lembrar do destino de Lucrécia saberá que estamos incorrendo em território trágico e tétrico. O time de especialistas estava conduzindo experimentos com um corpo encontrado no pólo norte após a queda de um meteorito, batizado de Jenova. Gast imaginou que estivesse diante de um Cetra preservado pelas baixas temperaturas. Células foram extraídas de Jenova e implantadas em outros organismos vivos. Se a injeção de células fosse reduzida, o resultado é que o organismo ganhava muito em proeza física e mental. Muitas células e o organismo se tornava um zumbi, canibalizado pelo instinto de Jenova. Com remorsos de consciência, o doutor Gast pediu baixa para nunca mais ter de lidar com tais experimentos. Hojo, não obstante, só estava começando. Essa é a gênese conhecida do próprio programa SOLDIER da Shinra, em que soldados criteriosamente selecionados recebiam injeção de mako e também de células de Jenova, esta segunda parte ignorada por todas as cobaias.

Vincent se apaixonara por Lucretia. Lucretia, apesar de alguns sinais ambíguos de reciprocidade, acabou casando-se com Hojo. Ambos tiveram um bebê, e Hojo, sem escrúpulos, usou-o na pesquisa para formar Soldiers. Lucretia tentou se matar ao ver seu filho transformado num experimento, mas não o logrou. A combinação de células de Jenova com a infusão de mako tornou a mãe, quando o bebê ainda estava em sua barriga, virtualmente imortal. O nome escolhido para o bebê foi Sephiroth. Vincent confrontou Hojo, mas isso apenas resultou na sua prisão e utilização como cobaia, passatempo favorito de Hojo. Novamente temos uma vítima que conquistou uma indesejada imortalidade, bem como poderes de se transformar em outros tipos de criaturas. Horrorizado pelo que se tornou sua vida e aquelas das pessoas que o cercavam, Vincent escolheu entrar em sono induzido sem previsão de interrupção, alojado no porão de uma das casas de Nibelheim, até ser acordado pelo grupo do jogador. Ao ser informado de que o grupo talvez acabe encontrando Hojo pelo caminho, Vincent aceita se juntar ao bando Avalanche. Trinta anos depois, talvez Hojo receba o que merece.

Mais tarde no jogo Vincent localiza o paradeiro de Lucretia, que como ele também havia se isolado da sociedade, embora não num lugar clichê como um caixão. Ela pergunta a Vincent se ele soube algo de Sephiroth. Este mente que ele está morto. Assim como Dyne, Lucretia não tem um verdadeiro arco de redenção no enredo, é um personagem meramente fatalista.

Faltam agora as vidas de 4 personagens, os centrais: Cloud, Tifa, Aerith e Sephiroth. Modelo andrógino, Sephiroth tem os mesmos cabelos de Aerith (fica a dúvida de se são louros ou brancos, pois sua idade também parece indeterminável, tanto quanto o sexo, de longe), é muito alto e a maior parte das pessoas o consideraria belo. Há algo nele, talvez na soma de todas essas características, que parece gritar ou dizer: “Este vilão é imponente”. Tons de verde no olhar representam, em FF7, a exposição ao mako: quão mais intensa a cor, maior fôra a exposição à energia. Os olhos de gato ou serpente de Sephiroth transmitem sabedoria e malícia, e não há um tom de verde mais puro na obra.

Cinco anos antes do marco zero da gameplay, Sephiroth e Cloud viajam juntos como Soldiers. Eles se dirigem a Nibelheim para consertar um reator da Shinra. Sephiroth é amigável e afável, quase um super star do meio militar. Sephiroth é como o Pelé dos soldiers. No mesmo flashback o jogador controla um time de Cloud/Sephiroth e percebe quanto dano (milhares de vezes a mais) Seph consegue produzir em relação ao rookie mais jovem. Dentro do reator, Sephiroth conserta rapidamente o defeito. O que ele encontra de brinde, no entanto, muda sua trajetória para sempre: câmaras em que corpos jazem encerrados num estranho líquido contêm o que Sephiroth imagina serem monstros, “filhos fracassados de Jenova”, que não suportaram o nível de transfusão celular ao qual foram submetidos. Isso faz Sephiroth perguntar por suas próprias origens, sendo o guerreiro diferenciado que é.

Sephiroth vai à mansão das pesquisas de Hojo, Gast e Lucretia e, tendo acesso a uma vasta biblioteca, começa a pesquisar para encerrar suas dúvidas. Um dia vem a epifania; “Eu sou um Cetra, um alienígena; vocês humanos são traidores, desertores da raça pura. Eu, por outro lado, nasci para reinar”. As anotações estavam distorcidas, pois os Cetras quase foram extintos por Jenova, e não o contrário: Jenova era uma calamidade que veio do espaço sideral, mas não era um Cetra.

Sephiroth incendeia Nibelheim e declara que deve encontrar sua mãe. No incêndio, ironicamente, morre a mãe de Cloud. Cloud segue ao reator para tirar satisfações de Sephiroth, onde encontra Tifa e o cadáver de seu pai. Sephiroth ficou louco e ataca todos que surgem diante de si. No confronto do underdog contra o multi-estrelado veterano de guerra, um milagre acontece e, encurralado pela espada de seu mentor, Cloud o suspende no ar e o arremessa no poço de mako, matando-o. Mas por que Sephiroth reapareceu nesta era, cinco anos depois?

Jenova e Sephiroth são ambas nomenclaturas bíblicas. Para dizer a verdade, nomenclaturas talmúdicas. Jenova provém de Jeová, o deus judeu. Sephiroth vem do hebreu sefirot, que descreve as 10 emanações de deus em suas aparições no reino dos mortais. Para entender disso profundamente teríamos que ser especialistas na Cabala e verdadeiros místicos! Mas basta resumir que o sefirot é uma forma de esquematizar para leigos o que algo infinito poderia ser, se uma mente limitada como a nossa fosse capaz de entender algo que não é finito e, portanto, transcende toda compreensão. Seria Sephiroth, portanto, o “tentáculo carnal” da deidade maligna alienígena que quer parasitar o mundo dos heróis de Final Fantasy VII? Tudo indica que essa é uma leitura válida. Porém, o jogo não oferece uma resposta consensual sobre o dilema “quem afinal puxa as cordas?”. Não deixa de ser irônico que o grupo do jogador esteja sempre perseguindo Sephiroth, quando, mais tardiamente, começa a perceber um padrão: Cloud e os outros estão sendo atraídos, não evitados.

Discutamos, então, Aerith(JP)/Aeris. O momento mais famoso de FFVII é a morte de Aerith. Com 28 anos que ela aconteceu, não faz sentido omitir o fato alegando “spoiler”. Esse acontecimento faz parte da cultura geral dos videogames. Enquanto que nos games personagens controláveis morrem o tempo todo, parece uma “punição desmedida” com o controlador que se mate automaticamente, por procuração, um personagem que deveria ser assassinado apenas após uma pobre performance. Uma tristeza diferente é sentida, um “luto digital”. Pode-se alegar que Aerith é até o personagem principal de FF7, com quem o jogo começa e termina, simbolicamente. As materias e equipamentos da moça também vão com ela para sempre no arquivo de jogo. Seu character design, o da mulher de rosa que sabe brigar (e perita em magia de defesa), atende tanto aos que querem uma donzela para proteger quanto uma donzela firme com que atuar. Na personalidade, suas linhas de diálogo são algumas das mais irreverentes e inteligentes do roteiro. Um sarcasmo leve e uma sabedoria que aparenta mais que os anos vividos. Um passado misterioso e o hipotético dom de prever o futuro e até “conversar com o planeta”. Isometricamente em relação a Sephiroth, Aerith pode ser comparada a Jesus Cristo. Era idéia do time de desenvolvedores que ambos fossem irmãos ou mesmo um casal. Os dois se espelham, são antípodas. Como a última de uma espécie que não é exatamente a humana, ela se sacrifica para tentar salvar o mundo. Curiosamente, ela tem um grande apreço pelas flores, algo que pode estar em paralelo com a passagem de Jesus no jardim de Getsêmani. A materia que cai de Aerith quando ela é executada poderia, nessa toada, ser interpretada como o Espírito Santo da estória, capaz de purificar a black materia de Sephiroth.

Tifa Lockheart ganha algum hate gratuito da fan base, ainda mais quando contrastada com Aerith. A “moça menos inteligente e mais peituda”, “mais calada”, “arroz com feijão” ou “par previsível de Cloud”, vulgo lado mais insosso do bendito triângulo amoroso… De certa forma, é uma grande injustiça com outro grande personagem cheio de nuances. Tifa é uma “patricinha” de origem, quando comparada a Cloud. Ambos são de Nibelheim. Tifa é filha do prefeito, e tem um amplo círculo de amigos, ou pelo menos de puxa-sacos. Cloud é o protótipo do garoto excluído na infância. Qual seria o “ponto de virada” de uma personagem que, visivelmente, contrasta com outros tipos mais bem-pensados para a trama e que decididamente evoluem em algum ponto? Barret tem seu momento-chave com Dyne, Red XIII/Nanaki aprende sobre seu pai no seu vilarejo natal, Cid – que no começo serve mais como alívio cômico – supera seu passado rabugento e (parcialmente) sua misoginia ao se integrar ao grupo, até Vincent e Yuffie têm sua redenção, embora nem sejam characters obrigatórios. E até Cait Sith se redime da traição inicial “se sacrificando” pelo bando no Templo dos Antigos. Tifa não tem uma cena emblemática como todas as listadas (para Cid seria sua ida ao espaço). O mais próximo disso que há é quando Tifa “invade” o inconsciente de Cloud para ajudá-lo a superar seus traumas – mas esse é um ponto decisivo na biografia de Cloud, não de Tifa. Seria esse um mero personagem-estepe?

O caso que irei defender é o de que Tifa é o personagem mais humano do octeto que acompanha Cloud. Mais down to Earth ou pés-no-chão. Seu arco se desenvolve de uma maneira diferente e invisível para muitos. Demos uma olhada nas motivações de Tifa. No início a paixão platônica era como que unilateral, partindo apenas de Cloud. O primeiro terrível incidente na vida da garota foi perder a mãe, que se acidentou na cadeia de montanhas que circunda Nibelheim. Ela foi em uma expedição tola para tentar resgatar a mãe, que não julgava morta, apenas perdida ou ferida, e foi nesse evento que os “outros” terminaram por abandonar Tifa. Cloud foi o único que ficou a seu lado quando a trilha já era das mais perigosas. Ambos se acidentam, e por mais que tenham sobrevivido sem seqüelas, como não havia testemunhas do fato, acabam culpando Cloud pelo que podia ter acontecido com Tifa, considerando-o um moleque irresponsável. O pai de Tifa proíbe-a de revê-lo. Ambos são, nesse momento, pré-adolescentes. Anos depois, no auge da puberdade, Cloud arranja um encontro escondido com Tifa. Ela vai, sem conseguir imaginar do que se trata – talvez de uma declaração tardia? Cloud tinha agendado o encontro para poder se despedir: diz que vai se tornar um Soldier, sair de uma cidade sem perspectivas e se tornar alguém. De certo modo era sua maneira de provar seu valor. Tifa o obriga a cumprir uma promessa: voltar para buscá-la, se um dia ela precisar de ajuda. Uma promessa um tanto vaga, é verdade. Passam-se cinco, ou melhor dito, sete anos até o começo do jogo. No entanto, algo crucial se dá dois anos depois de Cloud abandonar Nibelheim.

É o evento da visita de Sephiroth com a Shinra. Tifa, agora perita em artes-marciais e nos caminhos das trilhas perigosas, serve de guia. Foi quando o ex-Soldier começou a suspeitar ser “mais que um humano”, e ligar sua genealogia a Jenova. Ensandecido, Sephiroth, antes um herói, mata o pai de Tifa e incendeia Nibelheim. Numa cena, de novo, sem testemunhas, Cloud consegue o imponderável, e derruba Sephiroth na corrente de mako do subterrâneo, supostamente matando-o. Cloud estava presente, mas num uniforme, dos pés à cabeça, coberta por capacete, de um simples capanga da Shinra, o que Tifa não sabe, e Cloud, hoje, na época do jogo, não lembra. Sem parentes e sem lar, Tifa decide migrar para Midgar, e assim inaugura seu bar e entra para a Avalanche. Demoraria outros 5 anos para topar com Cloud à beira do esgoto, na estação de trem.

Cloud Strife, errático, não sabe o que acontece consigo nos dois primeiros CDs do jogo. Apenas Tifa tem mais suspeitas, embora não se pronuncie sobre isso nem converse com Cloud tentando extrair-lhe informações ou ela mesma esclarecer acerca de seu passado. Cloud tem perda de memória crônica, sofre de alucinações e dores de cabeça terríveis. Os dados não batem. Cloud pensa que viu Tifa pela última vez, antes do reencontro, há 5 anos. Na cabeça de Tifa não faz sentido: haviam sido 7 anos. Em Cosmo Canyon ela chega a perguntar, hesitante: Cloud, você é… você mesmo, certo? Ela sofre por dentro com essas contradições mais do que qualquer um do grupo, alheio a tudo isso.

Depois da entrega da materia negra a Sephiroth e de quase matar Aerith dominado por forças sobrenaturais ou então um lado obscuro incontrolável, o jogador também aprenderá a duvidar de Cloud, mas, cronologicamente, só muito depois de Tifa levantar, no seu coração, graves suspeitas.

A verdade só é levantada na grande cratera setentrional, em que Sephiroth invade a cabeça de Tifa, reencenando os eventos do fatídico dia da morte de seu pai e destruição de Nibelheim. Sephiroth mostra os eventos tal qual eles se deram. Cloud não consegue acreditar, compartilhando da visão, pois é Zack quem acompanha Sephiroth, e não ele mesmo. Tudo havia sido uma farsa? Cloud é um clone, um soldado experimental, um número, um “última classe”? Seu mundo interno começa a implodir, e Tifa, o que ele tem de mais próximo de um companheiro de vida inteira, parece querer colapsar junto. Cloud não é quem ele afirmava que era. Teve vergonha de se identificar como um soldado raso aquele dia, projetou-se em Zack, que era tudo que ele queria ser, ou podia ser, considerando que Sephiroth era quase que uma meta inatingível, um alienígena: mais jovem, promissor, um Soldier em ascensão, Primeira Classe, respeitado pelo mesmo Sephiroth.

Embora seja uma mentira que Cloud seja um clone criado por Hojo, toda a confusão mental de Cloud àquela altura é real, e sua exposição ao mako explica seu mal-estar físico recorrente. Cloud é Cloud. Pelo menos a estória de Sephiroth explica por que Cloud apagou anos de sua vida em auto-preservação. No fim, havia essa conexão antiga com Sephiroth: Cloud era mais um da legião que estava condenada a seguir Sephiroth, e não a persegui-lo, por livre-arbítrio, como se pensava por grande parte da narrativa.

Tifa é a pessoa que resgata a auto-confiança de Cloud e, assim fazendo, evita o fim do mundo. Mas ela é mal-vista por seu silêncio persistente. Pensemos como agiríamos no lugar dela… Cloud é o protagonista, e ganha por isso, automaticamente, a simpatia do jogador. O mesmo não pode ser dito de alguém que “sabia mais do que nós” e evitou “nos contar tudo”. A verdade é que, sozinha, no grupo pós-Avalanche, pós-Midgar, sem lar pela segunda vez, Tifa tinha em Cloud a única companhia duradoura, a única família. Poderia ela bruscamente desmentir sua alegada identidade, apagar sua existência? Não lhe era lícito. Ainda mais considerando-se que, querendo ou não, Cloud cumprira sua antiga promessa… Humanos são criaturas falhas, e podem ficar calados em prol de quem amam. Não existe explicação mais razoável. Tifa é gente como a gente.

Cloud Strife. O protagonista por último. O garoto da alabarda. O edgelord, loiro no fim da adolescência, tipo bonitão, o sonho de qualquer um. Assim Cloud sparecia nos materiais publicitários, e assim parece no começo do jogo. Sua postura e atitude deve ter vendido muitas cópias do jogo. E no entanto Final Fantasy VII sabia que era preciso ter substância e subverte todos esses tropos carcomidos e esfarrapados. O taciturno Cloud pode ser mais heróico e “irrealista” que Tifa, mas ainda é feito de carne. Desde a primeira missão, ao demonstrar sintomas psicóticos no reator, o RPGista esperto entende que Cloud pode não ser a testemunha ocular mais fiável, e a pessoa com menos segredos no grupo dos personagens controláveis. Outro grande choque se dá quando o time chega a Nibelheim e tudo parece intacto… Toda a reputação e imagem de Cloud começam a ruir em farelos ao longo do enredo, o que é muito bem-executado pelos roteiristas da Square. A verdade é que sem aqueles que lhe dêem suporte Cloud não pode vencer Sephiroth. Ele pensa até em desistir da jornada após o incidente do templo. Barret, Tifa e Aerith seguram sua barra.

CRÍTICAS À GAMEPLAY

As batalhas deveriam possuir mais de 3 PCs, pois os 6 (possíveis) personagens extras são mal-aproveitados. As animações de summons (vide Knights of the Round e a Supernova do Sephiroth) deveriam ser mais breves ou saltáveis. Os minigames deixam a desejar (vide a corrida de chocobos, impregnada de slowdowns; a perseguição destrambelhada em motocicleta; ou apertar X ou Bola – button-mashing – para não morrer congelado perto do fim do jogo, uma iniciativa digna de Mario Party¹).

¹ Creio que podemos chamar alguns puzzles mais mal-sucedidos para completar dungeons de “minigames” também.

A TRILHA SONORA MONUMENTAL

Tentei achar uma música ruim ou insatisfatória no jogo, mas não dei conta. Esse está entre os melhores trabalhos de Nobuo Uematsu, o lendário compositor da Square, comparável ao que ele fez em FF6 e FF9. Há composições enérgicas, drásticas, tristes, etéreas, misteriosas, alegres… Duas são especialmente citáveis: Aerith Theme e One-Winged Angel, monumental tema tocado para a nêmese do jogo. O tema de Aerith pode levar os mais sensíveis às lagrimas, mesmo que nesse 1997 a qualidade das músicas não seja exatamente operística: elas sofrem compressão e são quase que MIDI. Já o tema do algoz Sephiroth é algo longo e épico, reminiscente, provavelmente, da ária da Rainha da Noite de Mozart.

CONCLUSÃO

Desejando-se jogar Final Fantasy VII, recomendam-se as versões modernas, fora do PSOne, na Steam, no Switch e no PlayStation4. No Switch basta pressionar uma Tecla para ligar/desligar encontros aleatórios e aumentar a velocidade em até 3x. O jogo é por demais lento e apinhado de batalhas no mapa para ser 100% usufruído, em nossa década, de outro modo. Viva as conveniências ultra-modernas! Na Steam pode-se, ainda, melhorar graficamente o jogo através de mods da comunidade.

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