
REVIEW N° 1081 DO NEWGEN
Por Rafael “Cila” Aguiar
Apple II
+ iOS & PC (DOS).

Versão para Microsoft Windows DOS
Akalabeth
Akalabeth: World of Doom (Windows DOS)
Akalabeth: World of Doom! (iOS)
Ultima 0 (nome consagrado)
| F I C H A T É C N I C A |
Developers California Pacific / Quantum Toast (iOS)
Publishers California Pacific / Quantum Toast (iOS)
Estilos Role Playing Game > old school > Top-down / First-Person
Datas de Lançamento:
AP2
1980 (EUA)
iOS
28/06/10 (EUA)
PC (DOS)
28/02/1998 (EUA, dentro da coletânea Ultima Collection, com outros 11 jogos da série Ultima)
| NOTA (este escore é uma média dos principais portais de games na web e revistas antigas quando for o caso, e também engloba a opinião dos gamers visitantes, além da crítica especializada; e não necessariamente reflete meu ponto de vista) |
5.64
| E S T E J O G O É P R A . . . | |
| (X) passar longe | (X) dar uma jogadinha de leve |
| ( ) dar uma boa jogada | ( ) jogar freneticamente |
| ( ) chamar a rua toda pra jogar | (X) uma incógnita |
| (X) um tipo específico de jogador Quem? Tem que ter PAIXÃO por jogos antigos para aturar os defeitos e limitações deste cult classic que, dependendo do gosto do RPG/gamer, pode até ser recompensador! | Quem jogar este também poderá gostar de: Dunjonquest: Temple of Apshai (AP2/ATA/C64/PC) Escape! (AP2) Oregon Trail, The (AP2/MAC/PC) Rogue (DOS) Ultima I (AP2/ATA/C64/MSX/PC) Ultima: Escape From Mt. Drash (VIC20) Wizardry: Proving Grounds of the Mad Overlord (AP2/NES/PC) |
| FAIXA DE VIDA ÚTIL ESTIMADA |
0h05 a 10h (leia as CONSIDERAÇÕES FINAIS!)
SENTA QUE LÁ VEM HISTÓRIA:
NASCE UM NOVO CONCEITO, AVENTURAS INTERATIVAS NO COMPUTADOR!
Lá pelos idos de 1978, Richard Garriott, então um mero nerd jogador de RPG de mesa, viciou-se num dos primeiros jogos (jogos de texto, à época, devo dizer) de computador de RPG – hoje diríamos puzzle ou exploração – da História, um suposto explorador de labirintos em 3D (hipérbole para o tipo de interface pré-histórica, como o termo “3D” seria compreendido atualmente, é claro), uma verdadeira revolução operante nos Apple II (que podemos considerar uma das primeiras levas de computadores caseiros), chamado Escape!. (Este “clássico cult” dos confins dos anos 70, época romântica da programação em que um só sujeito com conhecimento de linguagem de programação e tempo à disposição, e sem um considerável aporte financeiro, podia produzir um jogo inteiro, foi, incrivelmente, num surto repentino de revivals e old school gaming, trazido de volta do necrotério dos bits e remodelado em polígonos pela Ragdoll Inc., na plataforma Steam, em 28/01/2018! NÃO CONFUNDIR com o puzzle de terror Escape F1rst, lançado na Steam 3 meses e meio depois!)


Imagens do lendário Escape! (Apple II, 1978) do “cortador de mato” Silas Warner. Se hoje você joga seus simuladores de mundo real e MMORPGs com imersão estupenda, isso se deve aos “cortadores de mato” que vieram antes de você, lembre-se e seja grato!
O primeiro parágrafo tinha sua necessidade de ser. Foi a partir daí que veio o marco zero da série Ultima, Akalabeth. Se Akalabeth é o marco 0, podemos chamar as aventuras de Garriott em seu PC caseiro em Escape! de “marco -1” do Role Playing Game nos microcomputadores. Na verdade, Garriott já sabia como programar quando pôs as mãos em Escape! – ele só não sabia que podia criar coisas tão divertidas e instigantes com seu conhecimento em BASIC. Ele começou a trabalhar em vários simuladores do Dungeons & Dragons de mesa no computador da escola. Naquela época, no secundário americano, o aluno tinha de apresentar um trabalho final para passar de ano na matéria de Informática. E foi o que Garriott fez: com seus “joguinhos”, obteve a aprovação do professor! Fato é que agora Garriott se sentia apto, após a escola, a mesclar as regras de combate de Dungeons and Dragons com o tipo de First-Person jurássico que os protográficos de PC estavam começando a tornar possíveis. Sprites coloridos desenhados na tela simulando uma perspectiva tridimensional. Era o bastante para fascinar os usuários de então. O computador ainda era entendido, basicamente, como uma máquina de escrever aperfeiçoada, sonho de consumo de escritores, contadores ou qualquer profissional liberal do gênero. Às vezes era mesmo um adulto de cabeça arejada que constatava – assim que descobria que seu novo eletrodoméstico podia ser uma fonte de entretenimento – que ele poderia valer tanto quanto, digamos, um carro novo, senão mais! Se não em preço, pelo menos em estima. Mas o nº mais contundente das vezes, admitamos, eram os filhos desses pais que compravam computadores que estavam mais propensos a enxergar essas “utilidades secundárias” ou acidentais daquelas curiosas maquininhas com monitores de tubo e telinhas esverdeadas, teclado alfanumérico e mouse, além de um gabinete enorme que guardava “o cérebro” do kit inteiro!
Garriott, felizmente, não estava sozinho: enquanto ele escrevia o script dos jogos, sua mãe (!) ajudava desenhando os “gráficos dos monstros”, que ele recriava em ambiente digital com aquele bando de 0 e 1. Os projetos que ele havia apresentado na escola eram relativamente simples, mesmo para este contexto ainda muito seminal. Garriott sabia-se capaz de algo maior, nas pegadas de Escape!. Depois de um ano de intenso trabalho e play-testing (de nada adiantava ser algo genial se não funcionasse na prática), ele apresentou o jogo que chamaria de “sua primeira obra-prima” a seu círculo de amigos íntimos, familiares e (pasmem!) à namorada (nerds com tempo para socializar, que desconstruidões do caramba!). Havia nascido Akalabeth…
Naquela mesma época (já eram meados de 1980), após graduar-se na escola e logo antes de entrar para a faculdade, Garriott arranjou um daqueles trabalhos de verão, nada promissor nem começo duma carreira propriamente dita, como vendedor na ComputerLand, loja de computadores de Houston, Texas. Por pura casualidade ele mostrou Akalabeth ao chefe, John Mayer, que gostou tanto da coisa que convenceu o jovem a lançar o jogo comercialmente.

CURIOSIDADE: O game não tem som!
Nem um pouco deslumbrado, no entanto, Garriott preparou apenas 16 cópias em disquete, xerocou o manual de instruções estilo fanzine, onde se identificava com o pseudônimo Shamino Salle Dacil,¹ e embalou cada par (mídia + caderninho de 10 páginas) numa simpática sacola ziploc (basicamente uma sacola plástica com zíper) para vender seus kits que, segundo ele, eram bizarros e indies demais para fazerem algum sucesso. Mas eis que 15 dos jogos sumiram das prateleiras da ComputerLand quase que instantaneamente; Mayer, algo visionário, não perdeu tempo e enviou o 16º sample por correio à California Pacific Computing. A software-house não pensou duas vezes antes de emitir uma passagem aérea para o garoto-prodígio Richard Garriott viajar o quanto antes aos escritórios da empresa e assinar seu primeiro contrato a sério!
¹ Tudo isso de “fanzine” e “nicknames” nos remete logo de cara aos místicos começos, tão underground e “púberes”, se assim posso dizer sem soar ofensivo, do Black Metal, para quem gosta da coisa. Mas é importante não romantizar demais a história dos pseudônimos e materiais apócrifos – muitos acham que este manual de jogo, que servia como uma introdução conceitual, além de técnica, foi assinado como Lord British, e não é verdade. Lord British é o alias mais conhecido de Richard Garriott e consagrado pela série Ultima, mas a verdade é que, além de ser o nome de um dos personagens de Akalabeth, o único outro lugar onde ele aparecia era na tela-título (acima). A propósito, pode-se conferir o manual completo em https://www.mocagh.org/origin/akalabethcomputerland-manual.pdf.

Uma das 16 primeiras cópias do fenômeno Akalabeth, embalada numa sacola plástica. Dizem que uma coisinha dessas, sem funcionar, sai por vários milhares de dólares no ebay!
E o resto é História, com “h” maiúsculo mesmo: Akalabeth vendeu 30 mil cópias e tornou Garriott 150 mil dólares mais rico (fazendo uma correção monetária básica, coisa de 400 mil dólares em valores atuais). Uma ascensão meteórica muito similar e ao mesmo tempo oposta à de Joseph Power, que escreveu Wizard’s Castle na mesma época. Entre as coincidências e disparidades imediatamente sensíveis, Joseph ele mesmo ofereceu seu jogo numa loja de computador e foi contratado pouco tempo depois por uma publisher californiana. Mas um detalhe sutil gerou as conseqüências mais destoantes depois: como Wizard’s Castle não era para Apple II, e sim um computador muito mais obscuro, o game de J. Power rendeu várias casas decimais a menos que Akalabeth, contratualmente falando, e não lhe possibilitou seguir carreira, como é o caso do veterano game designer R. Garriott.
ENREDO
Mondain, o clássico primeiro vilão da série Ultima, é citado desde já em Akalabeth. Neste contexto, Lord British, o protagonista do Ultima clássico, já expulsou Mondain do reino, e o jogador deverá se encarregar dos monstros que Mondain deixou para trás, isto é, “terminar o serviço”. Em suma: pode-se argumentar que o próprio Ultima 1 é o Akalabeth 0, a legítima prequel, ao invés do exato contrário e mundialmente aceito, i.e., que Akalabeth é o Ultima 0: Garriott começou seu RPG pelo final e terminou pelo começo!

GAMEPLAY
A primeira tela do jogo pede que você insira um “número da sorte” (será uma variável usada para gerar aleatoriamente o mapa de jogo e os atributos iniciais do personagem – o que, se você é bom de dedução já sabe, implica em “novos jogos” a cada vez que o programa for rodado). Por fim, ajuste a dificuldade de 1 a 10.
Em Akalabeth você pode escolher entre duas classes: guerreiro ou mago. Guerreiros, fisicamente privilegiados, terão mais armas para comprar, mas os magos, em contrapartida, controlam o “amuleto mágico”, que pode representar o fiel da balança e o pulo do gato no desenvolvimento correto da sua ficha de personagem. Nada de nomear o personagem (por enquanto) nem escolher gênero ou raça; na verdade, antes mesmo de visualizar o mapa de sua terra você deverá comprar seus equipamentos iniciais, sendo o comércio seu ponto zero. No princípio, seria mais inteligente gastar maior parte de seus fundos com comida (Akalabeth possui um sistema um tanto peculiar e “punitivo”: seu personagem pode morrer de fome!).

A jogabilidade é um tanto desengonçada. Talvez porque hoje tenhamos de emular o jogo num Windows, mas não posso imaginar a interface do Apple II melhorando as coisas tanto assim. Enter caminha para o norte; “/” caminha para o sul, <- e -> caminham para oeste e leste, respectivamente. Mais comandos: “S” para abrir o menu, “A” para atacar, “P” para pausar, “X” para adentrar o castelo/catacumba (dependendo do contexto) e a barra de espaço para avançar o texto. Como era de se imaginar para 1980, não há save system (pelo menos na versão sem mod). O jogo foi projetado para ser finalizado numa sentada, embora acabe ficando estressante e penoso por isso, como veremos.

O singelo mapa de jogo: o “X” no topo representa a próxima dungeon. À direita, montanhas que circunscrevem sua exploração, uma vez que elas não podem ser escaladas. Você é essa cruz roxo-e-branco no centro da sua cidade.
Não há nada fora dessa tela: levando em conta que seu personagem ocupa o espaço de um quadrado, podemos dizer, com base nessa escala, que o tamanho do mapa-múndi é de 400 quadrados. São vários shops em vilas dispersas além da inicial, a entrada fixa para os calabouços e o castelo do Lord British, seu grande ajudante e mentor. O primeiro desafio, como insinuei acima, é não morrer de inanição. Uma recomendação para quem está morrendo muito nos primeiros passos é usar o mesmo “número da sorte” na tela de entrada, até conseguir memorizar as instâncias (quadrados na tela, que seguirão gerando os mesmos eventos), podendo programar melhor suas futuras ações.
A aventura, pode-se dizer, começa de verdade quando você encontra o castelo de Lord British e cita seu nome (que o jogador mesmo digita). Você ganha um boost nos atributos da ficha (só +1 em cada) e a sua missão, expediente que se repetirá “n” vezes: “mate o monstro ‘x’ no calabouço ‘y’”. Suas missões são contingentes, ou seja, também são definidas com base no algoritmo fornecido no começo, embora haja uma escala de dificuldade crescente.

Mais uma missão
Há uma estrutura básica binária para todos os labirintos: cada tela ou cômodo ou 1) já contem o monstro, escadarias e portas, ou 2) apenas parecer-se-á com uma sala vazia, o que quer dizer que ela basicamente possui nuances escondidas (passagens secretas) e que você precisa investigar mais até achar o monstro que procura. Como lido na tela acima, você já entra na dungeon sabendo o que irá encontrar. Os monstros são de classes distintas, cada vez mais poderosas conforme você avança. Vou dar apenas um exemplo ilustrativo de como a engine aleatória funciona: na dungeon 1 (level 1) você se depara com um rato; então, no level 2, haverá um rato e um inimigo novo, cuja morte será seu objetivo principal, digamos, uma caveira; em seguida, no nível 3, você cruzará com um rato, uma caveira e um ladrão (thief). Na quarta fase, a nova categoria de monstro tem tudo para ser um orc; e assim vai. Se há, não conheço a quantidade máxima de níveis, mas é bem difícil chegar à segunda dezena (level 11+), para se ter uma noção (veremos que isso não é obrigatório para “zerar” o jogo).
Além das criaturas citadas acima, fazem parte do rol de bastardos adversários gremlins, víboras, mímicos (Palhaço? Não, eu preferiria chamar de shape-shifter…), demônios, balrogs e carrion crawlers. Estando no mesmo quadrado do monstro (ou dispondo de flechas, ataque à distância), combate-se usando o “A” e selecionando a arma; em alguns casos, será necessário um terceiro passo, o “tipo de ataque”, quando a arma admitir. Os monstros não são muito espertos e tendem a fugir quando o HP diminui muito, o que força o jogador a persegui-lo pela dungeon até terminar a execução. O problema – e bem frustrante! – é que ao reentrar no modo batalha todo o life do bicho já vai ter regenerado, ou seja, você voltou à estaca zero e depende estritamente da sorte para conseguir matar a criatura antes que ela consiga fugir!

As batalhas oferecem escolhas interessantes: com um machado pode-se cortar, certo? Evidente. Em qualquer RPG do universo! Mas em Akalabeth você também pode escolher ARREMESSAR sua arma no inimigo abestado (o efeito colateral óbvio é perder a arma nos turnos seguintes)!
Mas não só de monstros e passagens secretas vive uma dungeon. Há baús que sempre estarão na mesma localização (o que é aleatório, repito, é apenas a ordem das missões, conforme o número da sorte digitado) e conterão o mesmo item. Ao contrário dos baús com os itens mais importantes de Zelda, por exemplo, em Akalabeth eles dão respawn quando você sai e entra na tela, isto é, o conteúdo dos baús regenera e você pode pegá-lo outra vez. Os itens que se pode acumular são dinheiro (gold), armas em geral e comida. Andares estão conectados via lances de escada, mas não só: buracos e outros tipos de armadilhas fazem o jogador cair em níveis inferiores. Obedecendo às classes, os monstros usarão habilidades especiais, como no caso do ladrão, que rouba seus itens eventualmente (dã!). Gremlins são perigosos: eles roubam sua ração, quer dizer, comida! Ô bicho sacana…
Akalabeth já contém na essência o sistema de HP “heterodoxo” do clássico Ultima. Os hit points (basicamente seus pontos de vida) são ao mesmo tempo seus pontos de experiência, e seu máximo não é atualizado em tempo real, mas apenas ao sair de um labirinto, quando, como se numa calculadora dum caixa de mercado, contabilizam-se todos os inimigos que você executou de uma vez só (quanto mais forte o inimigo, maior é o multiplicador; você se torna mais resistente quanto mais monstros elimina, num ciclo retroalimentador de força, perseverança e resiliência). Pode parecer bizarro e verdadeiramente lunático para os olhos pouco compassivos dos gamers atuais, mas era a forma que Garriott havia encontrado para evitar que seu personagem se aperfeiçoasse durante uma dungeon; ou estou apenas imaginando coisas e essa foi meramente uma limitação de programação que ele não soube resolver! (Outra questão é: não existindo itens de cura, a única forma de você recuperar HP perdido é cumprindo sua missão…)

DICA SOBRE O ITEM “COMIDA”: Como visto na tela, existe uma unidade padrão para sua quantidade de comida atual (seja lá se for em kg, L, mg, valor correspondente em moeda, tabela de calorias, valor nutritivo, etc.!), e também uma regra para o decréscimo deste número: -1 ponto a cada quadrado de movimento no mapa-geral e -0.1 (precisão decimal!) a cada ação (movimento pelos quadrados ou gesto em batalha) dentro das dungeons… É mais ou menos aquele velho “checkpoint” dos Arcades de corrida, mas ainda mais apelão…
Já pegou a dinâmica? Avançar significa explorar uma nova dungeon, “fazer a limpa”, melhorar sua ficha e encarar novas missões, mais árduas. Nunca se esqueça de manter os bolsos cheios de comida, pois nem Aquiles ou Zeus sobreviviam de estômago vazio! O rol de armas não é exatamente o que se poderia chamar de abundante, então conquistar um HP relevante será mesmo a estratégia mais indicada.
Mas eu falei sobre um misterioso amuleto, maior diferença quando da escolha entre ser um mago ou um guerreiro, sendo este último incapaz de usá-lo. Em dado ponto na narrativa, este item, que sempre esteve listado no shop, finalmente estará disponível para compra, por escassos 15G. Ele possui um limitador de uso e também será baseado na sorte, como se você arremessasse um dado, então não poderá ser acionado a seu bel prazer, embora ajude MUITO. Uma das funcionalidades é subir ou descer de andar imediatamente; outra mata o adversário, não importa seu HP no momento; outro recurso se chama “BAD??” e você não tem como saber o que acontece em seguida. Nove de cada 10 vezes isso realmente desencadeia um evento ruim (ó!), como feri-lo ou transformá-lo num sapo com 3 pontos em todos os atributos; mas atenção: quando finalmente ocorrer o “décimo evento”, você se tornará o HOMEM-LAGARTO, cujos atributos serão o TRIPLO do que eram anteriormente. Essa singular transformação é sozinha o motivo de se escolher o mago preferencialmente ao guerreiro no menu inicial da aventura. Nem juntando as últimas 30 vezes que você visitou Lord British poderia testemunhar tamanha magnificência! Após esta transformação, o amuleto desaparece. Você deve comprá-lo de novo se quiser repetir a transformação.
Essa mudança é permanente e cumulativa (a não ser que você sofra reduções via magia do próprio amuleto), então se você puder desencadear o “décimo evento” uma segunda, uma terceira e uma quarta vez,…, ad infinitum, o jogo estará no papo: com força, destreza, stamina e sabedoria sobre-humanas (lagárticas!) – estou falando de números na casa dos 3 dígitos –, é inconcebível que você não complete a saga.

Ter os atributos desse tamanho é como tirar 100 num dado de cem lados… TAXA DE SUCESSO CRÍTICA!
O amuleto se revela uma verdadeira faca de dois gumes: as únicas coisas a impedirem a felicidade futura do seu personagem mago seriam ser assaltado por gremlins ou virar um sapo e ter de recomeçar sua escalada de poderes… Pragmaticamente falando, seu êxito dependerá tão-só da sorte. A questão é que o power-up do “lizardman” torna Akalabeth, inquestionavelmente, mais fácil do que seria sem a presença do amuleto!
A exploração das dungeons é bem bacana, desconsiderando o fator desorientante da visão em primeira pessoa. Os inimigos podem surpreendê-lo de qualquer vetor, o que faz com que bifurcações sejam o clímax da tensão para o jogador. Você terá de fazer um registro, fora do jogo, das armadilhas, como a dos buracos, que não aparecem graficamente, mas fazem você perder um tempo considerável. Os layouts são muito similares de sala para sala para que você possa confiar apenas na memória. Como visto na imagem abaixo, uma sala nunca tem mais de 9 quadrados em nenhum dos sentidos (vertical ou horizontal). Mas, na realidade, são muito menos que 81 quadrados, porque a configuração é sempre a de um labirinto de corredores, com vários quadrados pretos (paredes opacas).

Então, quando é que se “zera” Akalabeth? Quando Lord British disser que você “já se tornou um cavaleiro” no momento de brindá-lo com uma nova missão. O mais provável é que isso ocorra depois de matar um orc ou um balrog. Será apenas uma tela in-game, ou seja, não é uma zeração no sentido explícito: você não será impedido de continuar explorando mazes e abrindo baús e usando amuletos, num loop insano e infinito (lembrando que não se pode salvar o progresso).
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Akalabeth é às vezes chamado de “primeiro Computer RPG comercial”. Embora não seja uma afirmação tecnicamente correta, trata-se, com certeza absoluta, de um dos primeiros Role Playing Games castiços, já que muitos dos pretensos RPGs dessa época não tinham elementos de RPG o suficiente para que os consideremos “puro-sangue”. Já Akalabeth cumpre os requisitos ainda em voga: ficha do jogador baseada em estatísticas, armas, sistema de combate, HP, sistema monetário, etc. O próprio Escape, que inspirou Garriott, não passa de um puro dungeon-crawler, sem story-telling algum ou indícios de um sistema mais elaborado, e ainda no seu próprio metier é menos complexo que os segmentos de exploração de labirintos de Akalabeth.

Quase todos os elementos do game acabaram sobrevivendo para ser reutilizados em Ultima e, assim, ganhar popularidade universal, estabelecendo-se como fórmulas ou estereótipos do gênero. Muita gente se admira ao conhecer Tolkien tardiamente e se deparar com um Balrog na leitura do livro ou na exibição do filme; é claro que foi dali que esse tipo de criatura da horda do mal brotou, mas muitos RPGistas o ignoram, e aprendem o que é um demônio manipulador do fogo lutando contra um! A fórmula de Akalabeth é, com efeito, tão consagrada que se manteria relativamente sem grandes mudanças até Ultima V (1988). No mundo dos games, 8 anos é uma eternidade.
A dificuldade é que seria reajustada na série que popularizaria os RPGs eletrônicos, mas devemos dizer que mesmo sem o truque do Lizardman não é impossível receber os parabéns de Lord British, embora seja obrigatório fazer desenhos dos quadrados dos labirintos, ser cauteloso e ter um cu-de-ferro, confirmando o maior clichê sobre jogadores de RPG da galáxia: não pode ser de carne um traseiro que se obriga a passar de 8 a 10 horas sem interrupção diante do computador, numa só tarefa: enviar os subordinados de Mondain para o inferno! É isso mesmo que você leu: estimamos que, sem ferramenta de save, e sem o uso mais benéfico do amuleto, o tempo de uma jornada exitosa estaria mais ou menos circunscrito nessa faixa, para gamers competentes e já experientes no título – o que exclui mortes! Lembrando que, se estiver achando a jornada muito insana, você pode escolher “1” na tela inicial para nível de dificuldade. Ah, então você já estava no “1”?… É…, existem outras opções de entretenimento por aí, Akalabeth não é pra você!
OBS: A média dos principais portais de games deu exatamente 4.64 para Akalabeth, mas eu fiquei com dó de dar uma nota verde (abaixo de 5) para um game tão precursor e subi 1 ponto no escore (veja no topo da resenha). Não é sempre que sou tão benigno!

O ideal seria jogar num emulador de Apple II, uma vez que no DOS o jogo roda em preto e branco; já no seu computador, Garriott conseguia renderizar estes pixels verdes, roxos, laranjas e azuis – poça de sangue muito bem-feita, que achou?
CURIOSIDADE 1: MAIS TOLKIENISMOS…
Sobre a inspiração para o nome Akalabeth, ele vem do título de um capítulo do livro Silmarillion, de J.R.R. Tolkien, “Akallabêth”, que narra a épica queda do continente de Númenor. Como muitos já sabem, Silmarillion, que expande a história da Terra-Média como a conhecemos na Saga do Anel de Frodo (fim da terceira era ou idade dos homens), descrevendo inclusive a origem dos deuses e do próprio Sauron, foi publicado apenas postumamente, enquanto que Senhor dos Anéis fez um tremendo sucesso com Tolkien ainda em vida, nos anos 50. Silmarillion é de 1977, ou seja, poucos meses antes de Garriott se tornar um desenvolvedor de jogos!
CURIOSIDADE 2: REMAKE AMIGÁVEL
Na transição para a era moderna (terceiro milênio), em 2010, nos sistemas iOS (iPhone e iPad), Akalabeth ganhou uma recauchutagem: autosave (já era mais do que hora!), inclusão de mapas das catacumbas e opção para ter mais comida (basicamente um redutor x100 para Game Overs!).

Lista de agradecimentos pela cessão de informações e imagens
CRPGADDICT.BLOGSPOT.COM/
GAMEFAQS:
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JUSTGAMESRETRO.COM:
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LEGENDRA.COM:
Luckra
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versão 2 – 2019; 2025.