Por Rafael de Araújo Aguiar
PlayStation


Lunar: Silver Star Story Complete
Lunar: Silver Star Story (Japão)
F I C H A T É C N I C A
Developer Game Arts
Publishers Kadokawa, Working Designs
Estilo Role Playing Game > Turnos
Datas de Lançamento
28/05/98 (JP), 28/04/99 (JP, PlayStation The Best), 28/05/99 (EUA), 01/99 (EUA, Fan Art Edition)
NOTA
8.4
Este jogo é pra…
( ) passar longe ( ) dar uma jogadinha de leve (X) dar uma boa jogada ( ) jogar freneticamente ( ) chamar a rua toda pra jogar (X) um tipo específico de jogador. Qual? O saudosista e fã de anime. ( ) incógnita
Poucas coisas superam o pacote original de Lunar:SSSC – os 2 CDs de jogo propriamente dito; um outro só com um making of; um mapa-pôster colorido, grande e detalhado do mundo de Lunar; um manual de instruções luxuoso como nenhum outro já visto, de capa dura de couro preto, com mais de 100 páginas e 100% colorido; outro CD, de som, com a trilha sonora oficial (do primeiro Lunar:SS, como veremos). É demais! A Working Designs não tem uma puta reputação com os RPGistas ocidentais à toa!

O overworld map
Os gráficos ficaram inalterados, exceto pela atenção que dedicaram ao refazimento de toda a paleta de cores. Os fundos de tela ficaram sensacionais depois das mudanças. Duas das canções do jogo são cantadas em inglês: essa a única grande novidade em termos de som do Saturn pra cá. No entanto, logo mais exploraremos esses quesitos mais de perto.

As ninfetas não poderiam faltar!
O sistema de jogo é o que mais atrai adeptos de RPGs antigos, portanto merece o devido aprofundamento. Nas batalhas, o menu inclui as 4 opções iniciais: AI (deixa tudo a cargo da CPU), Command, Defend e Run. Qualquer outra opção além de Command, se selecionada, fará de sua decisão algo final e sem volta, então a refrega se inicia (ou você tem sucesso ao fugir). Porém, escolhendo-se Command (sempre faça isso!), praticamente o mesmo menu se abrirá, só que dessa vez individualmente, ou seja, para que cada membro da sua equipe escolha por si só o que ele vai fazer, em consonância ou não com os outros. Pode ser a postura ideal para situações em que um dos membros está com o HP muito baixo e quer fugir de conflitos, já que é improvável que o time inteiro conseguisse a fuga, e se Run for tentado de primeira, coletivamente, além de ser um comando nulo pode significar a perda do primeiro turno da batalha! A diferença do menu “grupal” para o “solo” reside nas opções Attack, Magic e Item no lugar da própria Command, com a manutenção de AI, Defend e Run.


O kit completo (edição de 2001)!
Os métodos de ataque são múltiplos. Pode-se deslocar-se pelo “tabuleiro” até os inimigos e golpear com armas de curto alcance como espada, cajado ou machado, mas há também projéteis como flechas de arco ou pedradas de estilingue. O cajado, que em si é uma arma, tem uma função muito mais poderosa que é despertar o poder da magia do respectivo personagem (mas esse uso é pelo Item, e não Magic).

Os menus são simples em geral. Há apenas problemas de menor monta, e eu vou citar um deles. Para todos os lutadores exceto para o último da lista em cada turno pode-se cancelar a decisão efetuada retornando para a tela de comando com a tecla apropriada. Significa que com o último personagem (usualmente é Jessica) não são tolerados erros, como clicar na opção errada, porque a jogada acontece instantaneamente após o clique. Pode até ser algo banal e irrisório mas, como eu vivo cometendo esse tipo de deslize, gosto que o RPG lhe dê a chance de autocorrigir-se (Breath of Fire funciona de modo análogo).

Personagens privilegiados poderão atacar mais de uma vez por turno quando chegarem a um nível adequado, como Alex e Kyle. Esse bônus salvará vidas! Jessica, por outro lado, é quase sempre a muleta hospitalar da equipe: ideal para distribuir healers.
Imagino que todos preferem chefes únicos, bastante bem-trabalhados, que exigem estratégias particularizadas para serem derrotados. Uma coisa é certa em Lunar: não adianta ter personagens em níveis altíssimos, porque nem assim a vitória contra o boss ao fim da dungeon estará garantida. O sistema adotado é o seguinte: as estatísticas do chefe são voláteis, mudando de aventura para aventura, porque o cálculo é baseado nos números da ficha de Alex, o protagonista! Há um fator de multiplicação em cima de cada atributo do oponente com base nos talentos correntes de Alex. Fortalecer-se implica automaticamente em fortalecer o seu adversário em Lunar Complete! Não significa que o princípio basilar dos RPGs de “subir de nível” pode ser completamente defenestrado aqui, mas unicamente que o aprimoramento de level não precisa ser além do necessário para se enfrentar as batalhas contra inimigos comuns que antecedem aos “grandes confrontos” contra os chefes gigantes. Um segundo fator que exige pelo menos certo nível nas lutas mais trabalhosas é que algumas magias são aprendidas somente num patamar “x”, e muitos inimigos durões só caem com base numa magia de determinado elemento. Existe a manobra ardilosa de evoluir com todos os outros integrantes da companhia menos Alex, tornando o chefe, assim, comparativamente mais fraco, mas acredite: tamanha burla e charlatanice não vale o gasto de energia de sua parte! Deixe as coisas fluírem ao natural que não se arrependerá…

DICA: cada cidade tem uma estátua em honra à Deusa Althena (não escrevi errado). Apertar o botão de ação de frente para ela, como se quisesse conversar com o monumento, regenera todo o seu MP e HP! Quem precisa dum hotel quando se pode contemplar a beleza de uma escultura?!
O reverso da medalha, nas batalhas contra os bosses, é que, embora sejam mais exigentes, podem ser vencidas com a mesma fórmula repetidamente, desde que executada com perfeccionismo: energize seus guerreiros mais ofensivos; use spells defensivos para se garantir; abuse das melhores técnicas e magias pelo restante do combate; sem esquecer de curar os feridos quando necessário. Raramente algum contratempo o força a modificar esse padrão consolidado. Ou seja: os chefes tinham uma enorme potência para adicionar tática e variação, mas ele não foi bem-aproveitado.

Não esqueça de amarrar o cadarço
O fator surpresa, pelo menos, fala alto em Lunar no que se refere ao desenvolvimento da trama e assiduidade das dungeons, pois alguns chefes estão situados bem perto dos antecedentes, no roteiro, enquanto outros estão situados em intervalos bem mais espaçados. O jogo permite saves automáticos a qualquer hora, então não existe aquela expectativa de enfrentar “um grande inimigo” logo após um checkpoint, ou o de encontrar um checkpoint após uma batalha de titãs, afinal não é necessário!
As cidades são grandes e adornadas com animações minuciosas aqui e ali. Passarinhos sobrevoando os personagens, árvores sacudindo ao sabor do vento, a marolinha nas povoações litorâneas… Cada cidade tem sua atmosfera. Burg, onde Alex nasceu e viveu por muitos anos, é quieta e calma. Saith e Lann são lugares pobres e insalubres que vivem do comércio peixeiro. Meribia e Vane são aristocráticas. Reza e Nanza são permeadas de vielas e becos obscuros com ladrões à espreita. Meryrod está no fundo do mar… Um aspecto bem-pensado é que as portas de lugares recém-visitados pelo jogador continuam abertas depois que ele sai, o que além de acrescentar realismo ajuda na orientação física.

Salve o seu melhor amigo gordinho!
Ao passo que um labirinto ou outro se utilizam de bricolages de texturas (gerando uma sensação de déjà vu) – observe as cavernas dos Dragões Vermelho e Azul –, parte considerável das dungeons tem um layout original. Elas variam de florestas e grutas a torres macabras, sítios ultra-tecnológicos, etc. Não é difícil se perder enquanto tateia no lugar pelos primeiros minutos, mas assim que tiver se livrado das pilhas de inimigos que infestam o covil será factível reexplorar cuidadosamente os cômodos com agilidade, a fim de achar itens.

Onde tudo é possível, ilhas flutuarem é o de menos…
Na tela do mapa os PCs são microscópicos, mas nas dungeons, batalhas e cidades assumem um delicioso aspecto Super Deformed que enternece os olhos. Nos diálogos, avatares animezados aparecerão ao lado das legendas. Há muitos deles por personagem, denotando os matizes de humor por que passam. Através dessa ferramenta tão simples dissolvem-se quaisquer dúvidas acerca das capacidades de um 32-bit perante um 16: no Super Nintendo, Sailor Moon: Another Story fez um bom implemento do recurso dos avatares ao lado dos textos, mas havia apenas uma imagem estática para cada personagem, e só os centrais recebiam a regalia, provavelmente mais por falta de espaço no cartucho que por desleixo dos produtores. Com a memória ampliada, um jogo de PlayStation consegue resultados muito mais amplos.

É divertido vadiar pelas cidades e ler vários tijolos de textos dos habitantes. Lunar Complete garante pelo menos 35h de exploração.
Os gráficos das telas de batalha são os melhores do game. Os locais dificilmente se repetem, há detalhes no plano de fundo onde não havia, mesmo que as lutas se sucedam no mesmo terreno. Isso tem seu ponto negativo também. As plantas de Iluck, por exemplo, são tão multicoloridas que não é raro perder a noção da localização de um de seus guerreiros durante alguns segundos, sem querer brincando de procurar o Wally. Outro problema que pode ocorrer é não conseguir ler a quantidade discriminada nos status HP e MP, já que os números como que se fundem com o que está atrás – quando são da mesma cor (branca, verde ou vermelha), nem macumba resolve. Um retângulo opaco poderia envolver essas estatísticas, mas aí o espaço visual diminuiria bastante, então não podemos condenar os caras da Game Arts pela pequena omissão.

Nesse momento épico, o bronzeador é um item importante!
Que tipo de criatura se enfrenta? Lodo vivo, abelhas, arbustos revoltados, lesmas, coisas pequenas e asquerosas, outros inimigos mais imponentes e, fundamentalmente, dragões. Um cardápio completo e nutritivo para os RPGistas! Diferente do original de Sega CD, acompanhando as modificações promovidas para o Saturn, é possível distinguir os monstros na tela antes de entrar no modo combate, mas texturas e sprites repetidos são usados com exagero nessa parte. Muitas vezes o monstro que aparece quando abre-se o menu de batalha não é o mesmo do retratado no mapa aberto do modo ação. Vide os Water Elementals: na batalha, se parecem com cabeças de dragão; seus sprites no mapa são, não obstante, iguais aos de uma bolha de sabão!

Cala a boca e assiste!
Luna, o par romântico de Alex, está um encanto com seus olhos azuis e vestidinho de cigana. Jessica tem caninos e tatuagens tribais, o que contribui para sua caracterização como “tomboy”. As vilãs feminis mantêm a tradição intocada de que mulheres sexies são sempre malvadonas. Uma tem aquelas roupas coladas meio-Tiazinha/Mulher-Gato e outra hipnóticos lábios negros… Os NPCs masculinos? Estes não são tão interessantes, como a própria produtora reconhece. Por isso, só selecionei fotos das gatas para embelezar a matéria!
Ramus é o “ossos-largos” do grupo, nerd incorrigível; Alex demonstra um olhar terno e inocente sempre que se dirige a Luna; Kyle é o galã da turma; Nash tem um dos topetes mais assimétricos e repugnantes da história dos traços japoneses. Uma reclamação sobre o artwork – em linhas gerais, primoroso – é que o visual in-game não corresponde a alguns takes das animações: no anime, Mia tem o cabelo preto, mas nos sprites normais ele é azul; Lemia Ausa, a mãe de Mia, é loira nas seqüências de filme e sua peruca é castanho-clara nas partes interativas menos refinadas; afora outras discrepâncias bobocas…

O CD da trilha sonora tem todas ou quase todas as canções da versão original, de Sega CD, tão aclamada, principalmente no atributo música. Algumas das músicas estão remixadas e rearranjadas, mas pouco importa. Porém, o que fizeram dentro do jogo em si? “Talvez devêssemos reformular toda a trilha, mesmo que não fique tão boa, para mostrar serviço, agora que o console da Sony está recebendo nossa versão de luxo” – esse veredito deve ter sido o resultado das reuniões de pauta da Game Arts. Péssima escolha!
Tem uma faixa/BGM de dungeon que é horrenda. Não tanto quando escutada por inteiro, mas sua introdução é especialmente irritante. E toda vez que se entra numa dungeon e ela começa a tocar, a vontade é de dar meia-volta e sair. E a canção que embala a visita do jogador à cidade de Reza (não, não é um coro gregoriano!): como ela recomeça a cada vez que o jogador muda de tela (deixa ou entra numa casa, por exemplo), os mesmos acordes vão ser tocados ciclicamente de 10 em 10 segundos, na prática. Lyton, entretanto, consegue ser um caso mais grave que os dois primeiros juntos. Não bastasse o tema da cidade ser enlouquecedoramente ruim, ele existe em dose dupla: cantada por todos os seus habitantes sem descanso (isto é, figurativamente, já que é apenas instrumental no seu PlayStation), num primeiro momento a baladinha está incompleta, e o jogador pensa que é por isso que ela soa tão angustiante. Acontece que o vento da região, ao soprar por alguns buracos de uma gruta na vizinhança, produz a melodia de fundo (ã, Zelda: Link’s Awakening?). Só que pedras foram colocadas por alguém para tapar os buracos e a “sinfonia da natureza desafinou”. Experimente normalizar a situação, retirando as pedras, e… bem, a música fica mais alta e ainda muito ruim! Só de ler esse trecho, quem sabe do que estou falando deve estar se contorcendo de dor, com flashbacks vietnamitas sobrevindo à consciência. Próximo parágrafo, rápido!…

Ora, ora, quem diria que esse bando de aventureiros destemidos tem idade até para fazer filhos! Alex e os outros têm fisionomias de fedelhos de 5 anos em seus modelos SD!
O voicework de Lunar não nada é irrelevante em quantidade, e o que mais surpreende é que os atores americanos conseguiram deixar o nível de qualidade parecido com o da dublagem japonesa, que é sempre magnífica (para quem consegue aturar as entonações esquisitas do pessoal de lá, uma questão cultural…). Nas horas de animações (60 minutos a mais que no Saturno, a propósito) e batalhas é que as vozes mais aparecerão, o que não quer dizer que não haja falas em outros fragmentos. É estranho, todavia, você estar lendo um texto e de repente seu PlayStation fazer um barulhão – calma, o jogo não travou! – para carregar um áudio do personagem, recitando o mesmo box de legenda exibido na tela. Ficou a impressão de que a fala fica no tempo errado, mas é o melhor que o hardware do videogame consegue fazer!
Quanto às vozes dos personagens em si, eu gosto menos das empregadas para Nall, Luna e Phacia. Muitos discordariam sobre Luna, mas vozes anasaladas e muito boazinhas não são comigo! Nall – o bichano falante de Alex – é encarnado por uma mulher que eleva o tom algumas oitavas para fazer parecer que é o emitido por um animal fofinho. Sabendo disso, creio que o “Criador” tinha excelentes razões para não dotar gatos e pássaros de VOZ propriamente dita (sabe-se quão torturante um papagaio pode ser numa tarde calorenta em que resolva perturbar seu dono)… Talvez fosse melhor deixarem o dublador ser “ele mesmo”, como é o caso da gata Luna (xará!) de Sailor Moon, nada cretino ou estridente como Nall é aqui… Phacia é como Angela Lansbury, uma cantora de ópera, só que no lugar errado. Jessica e Mia são desagradáveis quando estão fora de si, mas em suas tonalidades normais e sérias nada há que se reclamar. Nash soa arrogante e suas sílabas ficam entrecortadas, mas tudo isso deve ser proposital. Kyle e Xenobia são as melhores dublagens.

E, finalmente, temos a cantoria. As cantorias. Luna canta na maioria dessas cenas em Lunar, mas você ainda escutará Kyle, Jessica, Nash, Mia e NPCs vários cantando. Os personagens do enredo não cansam de enaltecer o talento de Luna com as cordas vocais, como ela é perfeita, uma artista, e isso e aquilo, mas sinceramente, não há nenhuma verdade nos ditos! A famosa canção do barco – tire as próprias conclusões via YouTube – é agradável e tudo o mais (desde que o jogador queira experimentar alguns minutos de melancolia), até aquele “La la la” estragar o momento. Quando os outros combatentes do time inventam de cantar… favor desligar suas orelhas! Não é uma experiência prazerosa. O mais engraçado e tragicamente irônico a respeito do enredo e das gravações que fizeram para essa versão americana foi que uma das NPCs, que na estória de Lunar é uma má cantora, taquara rachada, canta, na realidade, muito melhor que quase todos os outros profissionais contratados! Acontece, não acontece? Gafes assim podemos perdoar, afinal dão assunto para mais de metro!
Lunar: Silver Star Story Complete possui qualidades apreciáveis por novatos, veteranos, jogadores casuais e ultra-fanáticos. Há uma infinidade de razões para amar ou odiar esse RPG. Pode-se emoldurar a storyline como um exemplo de antologia clássica, ou crucificá-la pelo simplismo e previsibilidade. Pode-se tecer loas aos gráficos 2D ou pensar que um look old school desses nada tem a ver com a era poligonal. As batalhas, outrossim, podem ser taxadas de repetitivas ao extremo ou, de repente, cunhadas de velozes e complexas ao mesmo tempo, o que é um senhor feito num RolePlay. E todas essas verdades coexistem sem contradição!

Lista de agradecimentos
James Gordon do honestgamers
MattMan do PSXExtreme.com
Aussie2B, Cyber-Sushi, Kashell Triumph, Misterbum do gamefaqs
mobygames.com
wordreference.com, particularmente no que se refere à escala tonal dos animais!
versão 2 – 2013; 2024.
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