Dreamcast

Metropolis Street Racer
F I C H A T É C N I C A
Developer Bizarre Creations
Publisher Sega
Estilo Corrida > Simulador > Rua
Datas de Lançamento 03/11/00 (EUR); 15/01/01 (EUA)
NOTA
8.6
Este jogo é pra…
( ) passar longe ( ) dar uma jogadinha de leve (X) dar uma boa jogada (X) jogar freneticamente (X) chamar a rua toda pra jogar (X) um tipo específico de jogador. Qual? Quem gosta de tirar onda com os cabelos ao vento ouvindo rádio em plena via pública movimentada; os amantes de autênticos desafios. (X) incógnita
Quando se discute o que a Sega fez de errado para matar precocemente seu último sistema, o Dreamcast, 2 games vêm sempre à tona: Space Channel 5 e MSR: Metropolis Street Racer. Isso porque a dupla recebeu um investimento financeiro pesadíssimo, que não necessariamente correspondeu em qualidade, e menos ainda em vendas. Space Channel 5 é considerado o mais injustiçado dos 2, e isso requer uma análise mais aprofundada no espaço adequado. Por ora, vamos nos ater à outra metade do problema.


Revolucionário e massivo. Assim pode ser caracterizado Metropolis já à primeira vista. Ele sofre de um severo defeito, no entanto, a médio prazo: MUITO DIFÍCIL. Frustrante, o mais das vezes. Se MSR tem algum mérito, é ter inaugurado um sistema de pontuação que influenciaria bastante os jogos da posteridade. Podemos resumir a situação toda com uma palavra: Kudos. Termo original do Grego, invariável no singular ou no plural que designa “título de mérito”, como que uma medalha pelo cumprimento de algo louvável. Significa que nas corridas do modo principal de Metropolis Racer você estará, literalmente, o tempo todo correndo atrás de Kudos. O jogo está dividido em 25 extensos capítulos, cada um composto por 10 desafios ou challenges. Estes variam de tempo da volta, velocidade máxima atingida e quantos carros você conseguiu ultrapassar em dado tempo a quão rápido completou o circuito (ou dois ou três seguidamente), se venceu o oponente-solo ou um elaborado campeonato com vários motoristas na pista. Sucesso representa Kudos comuns. Porém, completar os objetivos com excelência (recordes insanos) rende extra skill Kudos, Kudos especiais. Se a margem entre o estrito cumprimento dos objetivos e a performance efetiva foi realmente espantosa, superando todos os parâmetros, mesmo para extra skills, o jogo concede o que se chama de style Kudos (o Kudos supremo). Quanto mais Kudos, por conseguinte (até o máximo de 3 por missão ou challenge), maiores as chances de destravar segredos e ver seu caminho pavimentado rumo a novos chapters. Assim como em Tony Hawk’s Pro Skater, que exigia fitas ou pontos para destravar novas fases, capítulos avançados requerem cada um uma quantia diferente de Kudos.

Premissa um tanto simples e aditiva, além de diferente de tudo o que já se viu em jogos de corrida. Mas a aparência “dandiesca” (a elegância) do método é arranhada por uma série de eventos que torna a obtenção de determinados Kudos um tormento avassalador. Se as partes traseira ou frontal de seu veículo tocarem qualquer coisa (calçadas, esquinas, outro veículo,…), ganha-se uma penalty (penalidade). Como os Kudos, as penalties são cumulativas. Algumas penalties são o bastante para anular Kudos. Em outras palavras, ou você é um piloto assaz refinado, ou se verá forçado a repetir um mesmo nível umas 60 vezes atrás de um simples achievement ou Kudos. Para adicionar insulto à injúria, caso se jogue a fase novamente, e se vá muito mal, perdem-se todos os Kudos anteriormente obtidos. Se o gamer detinha 2 Kudos para determinado challenge e só queria obter um terceiro, pisando em ovos e se lambuzando na melancia ele pode não só ver suas chances de um terceiro Kudos pulverizarem como perderá os Kudos conquistados no passado a custo de tanto suor! E, como dito, flertar com uma simples parede ou ser tocado pelo adversário por trás (repare que não é culpa sua se isso ocorrer!) podem representar chance zero de obter Kudos e se enrascar a ponto de perder outros Kudos… Prepare-se, ainda, para colidir com barreiras invisíveis nas curvas durante trajetos em reduzida iluminação noturna, evento freqüente no jogo!

Sistema de Kudos com toda sua excitação e pesares à parte, Metropolis Street Racer é uma obra das mais polidas. Clima e tempo têm papel central, especialmente considerando o arranjo do carro que você pilota. São coisas absolutamente distintas enfrentar o mesmo estágio com pista lisa e céu azul e com pista escorregadia e úmida devido à chuva; para não falar do tempo nublado, que interfere na visibilidade. Mas o “tempo do dia” é que rouba a cena de verdade. Ao ligar o jogo pela primeira vez, o usuário deverá inserir seu fuso horário de acordo com o Tratado de Greenwich (só os brasileiros têm 4 zonas de fuso diferentes – Brasília está na GMT-3, três horas atrasada em relação a Londres, por exemplo). Graças ao relógio interno do Dreamcast, daí em diante todas as corridas se basearão nessa informação, determinando que horas são nas pistas em que você correrá, que podem se localizar em uma das três cidades seguintes: São Francisco nos EUA, Tóquio no Japão e Londres na Inglaterra. Alguns Kudos são exclusivos para determinadas horas do dia, o que exigirá seu planejamento, ou então cheating (“mentir” para adulterar o relógio a seu bel prazer). O mais bacana, entretanto, não é a questão das missões ativadas por horários específicos, mas a proeza gráfica de MSR ao mostrar pores-do-sol fantásticos e as luzes das agitadas noites metropolitanas, para ficar em dois exemplos!


São 50 veículos com os quais se refestelar (a grande maioria inacessível de início), réplicas perfeitas de modelos reais. Alfa-Romeo, Nissan, Ford e tantas outras montadoras são representadas. Infelizmente a Sega costuma se interessar tão-só pelos modelos da Terra do Sol Nascente, deixando de expandir a frota até mesmo quando o jogo é especificamente destinado ao público europeu e americano, como é o caso de MSR (movimento dos sem-Renault?): nada de supercarros que são nossos fetiches de consumo como Ferrari, Maserati e Porsche. Até aí é desculpável. Mas quando o Shelby Cobra e o Chevrolet Corvette também estão faltando começo a me perguntar em que diabos a Sega e a Bizarre Creations tanto gastaram, sendo o orçamento de MSR uma verdadeira bolada… Customizações nos exemplares obtidos também não são o forte de Street Racer, restringindo-se a mudanças na tintura. O destaque da bisonhice (não necessariamente uma coisa ruim!) vai para o kart e o cortador de grama, raridades destraváveis com muitos Kudos na carteira…

Meia centena de veículos precisa de muito asfalto onde desfilar, correto? Corretíssimo, e essa exigência lógica não foi ignorada pelos produtores. São 262 pistas. Tecnicamente, MSR não deixa nunca de ser só em 3 cidades, só que em diferentes burgos e bairros e com rotas alternativas, via fechamento de rodovias e redirecionamentos em sítios que apresentam bifurcações (quem já jogou Beetle Adventure Racing de N64 sabe do que estou falando!). O multiplayer é apenas bacaninha, não sendo o destino usual de quem prefere colecionar Kudos (e jogar o 1P mode com um amigo ruim, que perde seus Kudos em vez de conquistar os inéditos, pode ser um prejuízo e tanto!).

Os melhores panos-de-fundo de um jogo de corrida para Dreamcast estão aqui. Logo se vê por que MSR demorou tanto para sair (ele foi adiado por 2 anos!). A cor dos prédios, as caixas de correio, as cabines telefônicas, as franquias de Pizza Hut e qualquer minúcia que você possa imaginar são baseadas em fotografias e mapeamentos verdadeiros promovidos pela equipe de desenvolvimento. Significa que cada metro quadrado (cúbico!) das ambientações de Metropolis é a poligonização fiel das ruas das três cidades contempladas assim como eram no fim dos anos 90 e começo dos 2000. Os modelos dos automotores deixam um pouco a desejar na comparação com os cenários. É claro que associamos rapidamente o modelo retratado à marca real, mas já vimos mais polígonos gastos por carro em Tokyo Xtreme Racer 2, por exemplo. Uma boa análise do Skyline R34, modelo comum a ambos os jogos de DC, vai eliminar as dúvidas.


Richard Jacques é um gênio da música, e qualquer um que carece de convencimento acerca disso só precisa mesmo jogar Metropolis Street Racer. Cada cidade tem três estações de rádio baseadas no gosto local. Em SanFran a pedida é Country, Alternativo ou Rap e R&B (estes dois gêneros dividindo a última estação). Londres tem Jazz, Dance/House e uma rádio só para tocar os top 40 das paradas (bem coisa de britânico mesmo!). Os japoneses atacam de J-Pop (bleargh!), random (!!) e Dance/Club. Nesse sistema à la Grand Theft Auto não faltam locuções entre as músicas e mesmo slogans e vinhetas comerciais. Os DJs são brilhantes pedaços de voice work, que respeita os estereótipos geográficos: um porra-louca do interior na Califórnia; um velho com ar de culto para a rádio de jazz, etc. A quem detesta alguns dos gêneros acima, a solução criativa foi incluírem o CD player do seu carro na jogada: basta um clique para ouvir de tudo no shuffle ou gastar mais um tempinho criando sua própria playlist!

Metropolis Street Racer é provavelmente o jogo de corrida de quinta-sexta geração mais rejogável que existe! Para FRIEDSTRUCK, do GameFAQs, só para ilustrar, o período de dedicação ao jogo foi de 2 anos e meio, o que excede em muito a média de um game! Ademais das toneladas de veículos e pistas secretas e dos objetivos a alcançar com persistência, o multiplayer quebra legal o galho para 2 pessoas entediadas, e pelo menos durante a vida útil do Dreamcast era até possível postar seus recordes do Time Attack online. MSR pode não ser o melhor driving de Dream, mas certamente é o mais épico e gigantesco de todos; o Lawrence da Arábia do console da Sega. E lembre-se: “O negócio não é a rapidez com que você dirige, mas como você dirige quando está rápido”!

Rafael de Araújo Aguiar é sociólogo e um tanto apaixonado pela forma velha de se programar jogos
Lista de agradecimentos
FRIEDSTRUCK, grasu, Vyse_skies, PickHut do gamefaqs
mobygames.com
gamespot
versão 2 – 2013; 2025.