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herc’s adventures (ps & sat)

PlayStation & Saturn

Herc’s Adventures

F I C H A    T É C N I C A

Developer Big Ape Productions

Publishers LucasArts / Virgin / Bullet Proof

Estilo Action Adventure

Datas de Lançamento:

PlayStation

31/07/97 (EUA); 12/97 (EUR); 25/06/98 (JP)

Saturn

31/07/97 (EUA)

NOTA

7.4 (PS) | 8.3 (SAT)

Este jogo é pra…

(X) passar longe  (X) dar uma jogadinha de leve  (  ) dar uma boa jogada  (  ) jogar freneticamente  (X) chamar a rua toda pra jogar  (X) um tipo específico de jogador. Qual? O conhecedor da Grécia Antiga; apreciador de sátiras; gente atrás de desafio num 3D explorer, para 1 ou 2 players; pirralhos (a atmosfera da animação é convidativa sobretudo a essas idades); quem subestima gráficos e som e se importa mesmo é com o conceito de um game!  (X) incógnita

Herc’s Adventures é uma interessante incursão aventureira com storyline mitológica dos meados da “vida útil” do PlayStation. Por mais que prescinda de gráficos capazes de impressionar – mesmo para o período – ou de um som de excelência, além de ter uma gameplay razoavelmente simplista, este é definitivamente um jogo que soube tirar partido de seu material-base, de sua fonte de inspiração. Ao cabo, temos uma longa e desafiadora jornada pelas terras dos aqueus na era de ouro e até um pouco além… Não é um produto recomendado para o gamer casual, mesmo que seus traços infantilizados e o humor bonachão transpareçam o contrário. Para quem se pergunta, este Hércules nada tem a ver com a Disney, mas o lançamento é praticamente coincidente com o da aventura baseada no longa-metragem de animação, também de PS1. “Coincidência” é até um termo leve para se usar, já que provavelmente houve o astuto intuito de capitalizar com a publicidade da concorrente, sem pagar nenhum tostão em troca! Acho que funcionou, pelo menos no quesito meritocrático: Herc’s Adventures se dá muito melhor que Disney’s Hercules Action Game na comparação.

O artwork, se não há um acompanhamento à altura da resolução e do nível de limpeza das texturas empregados, é único e consistente. São 3 os PCs (personagens controláveis). Hercules – surpreendentemente diferente do design da Disney, e ainda assim dando a impressão instantânea de ser “o Hércules da lenda” – é o típico “pedaço de mau caminho” das garotas, patola principalmente da cintura pra cima e sem, quase, pescoço. O argonauta Jasão é o púbere atrevido, perito na lança. E Atlanta (Atalanta em Português, uma lépida caçadora criada por ursos) consiste na mulher mais apta para ajudar em “assuntos típicos de homem”. O panteão de deuses gregos é quase que integralmente (integralmente seria um exagero, já que eles existem às dúzias) representado, e de forma robusta (leia-se: gorda): caricaturas que dificilmente fazem jus à imagem temível dos originais, seja na aparência inofensiva ou nas condutas estupidificadas. Gosto especialmente de Dioniso como o mauricinho beberrão alemanizado! Toda essa comicidade e leveza contrabalança os ameaçadores avatares dos inimigos que se encara logo de cara, contando com os mais proeminentes dentre eles, quer seja, os chefões, embora sempre haja uma ou outra exceção, como a Hydra. Um bicho aterrador, imenso (hercúleo!), de 7 cabeças e lembrando uma serpente ou dragão, seria complicado de ser retratado nos 32 bits em todos os seus traços e pormenores, além de quadros de animação. Então, encolheram substancialmente a criatura e a tornaram um pouco mais afável: são “só” 4 cabeças, um corpo rechonchudo e duas patas!

O terreno é o mais das vezes homogêneo enquanto o jogador cruza várias cidades e sítios resolvendo quests, o que pode dar a impressão para um passante ocasional (sua mãe entrando e saindo do quarto de 5 em 5 minutos pra mandar você ir estudar, quem sabe) de que o controlador nunca faz nenhum progresso substancial. Claro que algumas regiões têm um look mais particular, como as porções gélidas ao norte, mas basicamente estar-se-á diante dos mesmos platôs rochosos, passagens pantanosas, escarpas montanhosas e praias. Graficamente, há um problema de perspectiva, já que a visão é a famosa ¾, de cima mas com uma leve inclinação diagonal. A percepção de profundidade dos objetos é malfeita. Quando seu personagem salta para trás, no que deveria haver um afastamento dele em relação ao primeiro plano (uma forma de iludir os espectadores é encolhendo o corpo em movimento), o que se percebe é tão-somente o boneco se deslocando para cima, como se subisse uma escada no mesmo plano bidimensional. Não que isso gere qualquer problema na gameplay, só enfeia mais as coisas.

Locomoção através dos cenários dessa Grécia Antiga configura-se em outro problema. Obviamente, não há aqui veículos motorizados, e viajar a pé pode ser um pé no saco! Apesar de não se tratar de uma exploração 100% linear é difícil sentir-se perdido, uma vez que as rotas e passagens são bem-delimitadas, não abrindo margem a dúvidas e desorientações de vulto. Ao mesmo tempo, pode ser maçante encarar o tanto de ziguezagues nas estradas, trilhas na mata e sobe-desces de montanhas, trechos tão claustrofóbicos e compridos. Para diminuir o tédio, a geração dos inimigos é randômica e há uma ligeira variedade de superfícies de piso (lama, grama, ou mesmo água, sendo o nado uma habilidade facultada aos três heróis controláveis [*]). Enquanto a jornada não chega perto do fim, quase todos os “próximos locais” a serem visitados são inéditos, mantendo o frescor da aventura. Até as rotas que levem a becos sem-saída oferecem algum tipo de recompensa ou premiação pelo intenso esforço do(s) controlador(es): itens ou armas raros em repouso, só esperando para serem coletados. O problema é no epílogo, que pode significar várias horas de gameplay: após desvendar todo o mapa, backtracking de áreas será assíduo, cansando um pouco os players. Bem que umas sandálias de Hermes nessas horas seriam apropriadas!

[*] Muito cuidado ao utilizar o meio aquático para se locomover – essa deve ser a última das alternativas. Seus personagens nadam muito bem, obrigado, só que os peixes estão sempre furiosos e são nadadores ainda mais competentes – e vão esmigalhar sua barra de life se você permanecer na água por muito tempo. Já viu aquele filme Piranhas? É mais ou menos o que acontece aqui… E, ao contrário das peripécias de Jason nos contos argonáuticos, infelizmente, não haverá nenhum arpão que o salve do pior!

Os combates ocupam um bom naco da jogatina. São, como era de se esperar, embates em tempo real. Escolher como lutar começa no menu de seleção do seu guerreiro, mas se estende a algumas posturas e botões na interface ao vivo. Todo personagem tem um ataque normal – para Herc e Jason são porradas com os braços, para Atlanta é uma flechada – e um outro especial. Iniciantes devem preferir controlar Atlanta, mais ágil e capaz de danificar inimigos à distância; veteranos quem sabe queiram zerar a aventura uma segunda ou terceira vez usando os demais… São cerca de 2 dezenas de armas secundárias, ainda, para acumular durante a jornada. Lanças, bombas, bolas de neve, “bafo de fogo”, trovões e até armas de raio (bem exótico para a Grécia Antiga, eu sei!) são algumas delas, e as diferenças nos pontos fracos dos inimigos garantem que você revezará bastante entre seu arsenal. Todas essas armas, mesmo aquelas que aparentemente não dispõem de “munição” para funcionar, se desgastam com o tempo, mas há sempre réplicas delas para apanhar de novo e de novo. Só tem uma fraqueza diante de todo esse repertório: inexiste um menu de seleção instantânea do objeto desejado, então, mais ou menos como na lenta interface de Zombies Ate My Neighbors (SNES), o jogador terá que apanhar um pouquinho do controle, recorrendo toda hora aos botões-de-gatilho na parte de cima, enquanto os inimigos, alheios a seu desconcerto, agridem sem trégua.

As batalhas contra os chefes são tão especiais que tenho de voltar ao assunto mesmo já tendo abordado superficialmente alguns desses inimigos maiores. São encontros consideravelmente criativos e épicos. Um bom número consiste de autênticos seres da mitologia, referentes aos 12 trabalhos ou não: o javali gigante, a Hidra acima comentada, o cão Cérbero, Circe e seus porcos, etc. Cada duelo é personalizado. A mesma estratégia não funcionará duas vezes. Alguns sucumbem diante de golpes em qualquer parte do corpo, como se fossem um inimigo comum, só que de maiores proporções e resistência; uma segunda classe exige que se desvende seu ponto fraco, ou jamais sucumbirão. Ainda mais: alguns bosses só são suscetíveis a armamentos bem específicos; alguns deles requerem a exploração de uma dungeon inteira até serem achados. Seja de aspecto pateta ou ameaçador, na prática esses adversários oferecem duelos quase sempre memoráveis.

As vozes digitalizadas são uma adição bacana, mas a qualidade da gravação é pobre. Quando mais é necessário ouvir sílaba por sílaba do diálogo de cutscene (em que os deuses do Olimpo passam instruções meticulosas), mais abafado parecerá o áudio! Os PCs gostam de pronunciar coisinhas enquanto espancam os adversários, mas são ditos quase incompreensíveis também. Um certo humor estereotipado grassa o título, como quando os ciclopes agarram uma ovelha e dizem “Ahh, peludinha!” ou levantam a casa dum soldado só para testemunhá-lo sentado e de calças arriadas, em meio a suas “necessidades”!

Mas para um jogo de humor pretensioso, o desafio é bem altinho. Os inimigos sobram na tela e infligem dano quase sem pausas; healing items (que em Herc’s Adventures tomam a forma de, olha só que coisa, churrasquinho grego!) são espaçados em demasia; o mesmo poder-se-ia dizer dos save points; fora que é preciso pagar em ouro pelo direito de salvar seu jogo mais uma vez (que diferença para outros títulos de PSOne mais amigáveis nesse quesito, como Symphony of the Night!). As fontes de regeneração, únicos lugares aquáticos não-empestados por peixes demoníacos, infelizmente são raríssimas e parecem se localizar nos piores sítios possíveis, nunca logo após uma batalha muito dura, ou então ao menos antes de uma! Não terminou ainda a lista de poréns: toda vez que morre, o jogador tem de encarar os perigos do Submundo de Hades antes de voltar à superfície. Só pela grande duração do jogo, ele já merece ser considerado “destinado aos experts”!

Uma característica para situar Herc’s Adventures à parte é o modo cooperativo para 2 jogadores simultâneos, uma maravilha poucas vezes vista na máquina da Sony. Como é uma saga extensa, recomenda-se iniciar arquivos de 2P nomemory card somente com gente que você tem certeza que pode ver freqüentemente, tal qual um vizinho ou irmão. Se os dois jogadores souberem trabalhar genuinamente em equipe, é uma pedida e tanto para deixar as coisas mais engraçadas e menos agravantes: o ideal é fazer acordos prévios sobre obtenção de itens regeneradores e armas, para não dar briga (e aliás os desentendimentos podem iniciar já na escolha dos bonecos, já que a caçadora é manifestamente superior aos outros dois)!

Herc’s Adventures pode ser sulcado aqui e ali de falhas e imperfeições, mas é praticamente sem rivais no PlayStation dentro de sua epopeicamente original proposta. Se você quer que gráficos e sons abaixo da média vão mesmo é se danar, pode ser a aventura que estava esperando desde a Antiguidade!

Rafael de Araújo Aguiar é sociólogo não-praticante e um tanto apaixonado pela forma velha de se programar jogos

Lista de agradecimentos

GameFAQs:

Syonyx

Mr. T

versão 2 – 2013; 2025.

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