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demon’s souls (ps3)

PlayStation3

Demon’s Souls

MELHOR JOGO DE 2009 DE ACORDO COM A IMPRENSA

F I C H A T É CN I C A

Developer From Software

Publishers Atlus (EUA), Sony, Namco Bandai (Europa e Oceania)

Estilo Action RPG

DATAS DE LANÇAMENTO:

05/02/09, 25/02/10 (JP) 

26/02/09, 24/02/10 (Ásia)

28/04/09 (Coréia do Sul)

06/10/09, 28/09/10 (EUA)

23/05/10 (OCE)

25/06/10, 01/08/14 (EUR)

PlayStation Store

08/01/13 (EUA)

23/01/13 (EUR, OCE)

18/09/13 (JP)

2014 (América do Sul)

NOTA

8.9

Este jogo é pra…

(  ) passar longe  (  ) dar uma jogadinha de leve  (  ) dar uma boa jogada  (X) jogar freneticamente  (  ) chamar a rua toda pra jogar  (X) um tipo específico de jogador. Qual? O hardcore RPG player.  (  ) incógnita

OReino de Boletaria é um lugar que certamente não perdoa. Estar nele significa embarcar em um ciclo aparentemente incessante de morte e ressurreição enquanto se exploram pântanos taciturnos, cavernas tenebrosas e túneis claustrofóbicos em castelos milenares. É como se as criaturas do inferno tivessem subido à superfície e metido uma adaga no coração da Felicidade e da Alegria, transformando o mundo em um conto sombrio. Almas de Demônios é o nome do conto.

Esse é um RPG – para lá de atmosférico – não-baseado em turnos de tirar o fôlego, que concilia a tradição e a inovação da melhor forma possível. Algumas regras serão de surpreender mesmo os RPGistas e bardos mais veteranos, e a dificuldade das dungeons é de meter medo no mais apelão dos mestres de mesa… O maior triunfo dos desenvolvedores foi fazer com que toda a frustração e o desconforto sentidos durante a exploração – sensação crônica de incorrer em erro ou de estar ficando demente, não mais capaz de raciocinar, a inexorabilidade da lentidão no aperfeiçoamento dos atributos do personagem, inimigos abismais… – se tornassem, de uma forma ou de outra, desejáveis, virtudes do game! Estávamos ficando cansados, aliás, de sagas em que salvar o mundo é mais fácil do que lavar a louça…

São cinco mundos fantasticamente terríveis. Lugares em que você jamais moraria, mas que é até tolerável atravessar por um tempo, não sem sentir calafrios e sobressaltos esporádicos… Alguns traços desses mundos são medievalidades óbvias e consagradas: dragões barulhentos, cavaleiros demoníacos em armaduras cromadas, castelos imensos com pontes levadiças na frente, etc. Mas a forma como todos esses elementos estão concatenados é admirável. Alguns demônios (acostume-se a eles, são as criaturas mais numerosas em Boletaria) voadores parecem arraias no ambiente errado, outros seriam assustadores com ou sem o machado gigantesco que carregam! Há um ambiente central – Nexus – que liga os cinco mundos temáticos, repletos desse tipo de esquisitice… Será mesmo possível dar nexo a esses quadros ambulantes e animosos que até mesmo Dalí teria dificuldade de pintar? (Mas não Kentaro Miura – R.I.P.)

O enredo não será – sequer o protagonista – pormenorizado nesta análise, mas estar-se-á envolvido em uma narrativa intrigante que concerne fundamentalmente a uma besta conhecida como Old One (algo como “Aquele que é Antigo” num linguajar lovecraftianesco) e ao porquê de tantas criaturas estarem infestando o reino. Dê uma boa apreciada em personagens carismáticos como a Noiva de Preto e o ferreiro Boldwin (penúltima foto da matéria). O único defeito na animação desses NPCs é que enquanto eles falam (praticamente todo diálogo in-game é falado), seus lábios não se movem.

Inimigo pequeno é a exceção

É possível investigar qualquer uma das 5 macro-regiões logo de cara, ao contrário do verificado em centenas de RolePlays… Mas se sentir à vontade nessas trilhas malditas já é outra estória… E não uma cheia de fadas, ajudas inesperadas, príncipes encantados e fins felizes! Se os primeiros minutos de tutorial não transmitirem nenhum medo ou insegurança, espere, pois os chefões rabelaisianos irão! Na verdade, você está destinado a morrer – você está destinado a morrer com certa freqüência! Ao expirar pela enésima vez, retorna-se ao arco-de-pedra por onde se entra no respectivo mundo. Suas armas e itens em geral não são afetados, continuam consigo. No entanto, perde-se a posse mais importante na mecânica de jogo de DS: as almas. Não a sua, que fique claro. A forma mais ortodoxa de acumular almas no inventário é matando diabos. Para se ter uma idéia, as almas coletadas funcionam quase como dinheiro: o jogador não poderá vender armas ultrapassadas nos mercados, nem depositar almas num banco para resgate ulterior, mas o que faz delas utensílios tão especiais é que são trocadas por pontos a mais na sua “ficha” e por especiarias (restauradoras de magic points), por exemplo.

O que foi que eu disse?

Morrer, entretanto, não lhe retira as almas permanentemente: é sempre possível voltar ao local da última morte, onde estará uma poça de sangue, que ao ser tocada devolve as tais almas, seja qual for a quantia. Porém, não se pode morrer mais uma vez e esperar resgatar almas antigas demais: a poça de sangue secaria; a única fresca é a da última morte do protagonista. Sem falar nas criaturas aleatórias que podem trombar com o herói no meio do caminho: fantasmas de lamparina (que queima, não serve só de enfeite!), bestas de cujas testas brotam tentáculos ameaçadores e qualquer outro tipo de bizarria que pode reduzir seu life meter à metade com um golpe só! Portanto, esteja em constante contato com o Nexo para gastar logo suas almas em pontos e no que mais lhe possa ser útil… Às vezes os saltos nos atributos são quânticos, fazendo de inimigos ontem irritantes uns bebezinhos indefesos hoje. Mas não pense que se trata da regra. Milhares de almas ainda não deixam o gamer imbatível, longe disso! Ao criar o personagem já será possível deixá-lo relativamente singular, já que as opções são bem vastas e o barato é tentar se sair bem de várias formas diferentes. Ter-se-á de optar por uma classe, mas ao progredir essa informação perde importância, pois o jogador terá de se tornar perito em todas as áreas. Alguns itens garantem que isso não demore anos fazendo faculdade! Mesmo um personagem inicialmente leigo em mágica terá que se tornar mago em alguma medida, pois os inimigos o exigirão. Força bruta não é o investimento mais inteligente: prefira gastar suas almas em “endurance”, isto é, resistência, a fim de morrer menos.

O sistema de combate é fluido, simples sem ser limitado, cheio de sutilezas que são desvendadas aos poucos. Ataques caóticos e furiosos não produzirão efeito, a não ser que se queira morrer gratuitamente! Trocas ágeis de armas, paciência e boa utilização do escudo são três requisitos para o bom lutador. Os neófitos sairão bastante machucados dos confrontos, até aprenderem o jeito de enfrentar cada classe de inimigos. O peso e velocidade do personagem muda conforme a estatura da arma, combos são de aprendizado paulatino e as animações são recompensadoras para quem gosta não só de participar, mas também de assistir. Acertar a espada na parede fará o metal vibrar e tornará o personagem vulnerável durante os duelos, ao invés de ser uma ação inócua: interage-se com os objetos e estruturas ao redor. A parte do corpo em que o golpe acerta também conta de forma diferente para medir o dano. Detalhes que parecem bobos a princípio se revelarão cruciais quando o jogador se der conta de quão tênue é a linha que separa a vida da morte neste universo impiedoso.

Multiplayer

Caso opte por jogar online, o gamer contará com um número nada modesto de implementos interessantes. É possível ser auxiliado por outros jogadores, seja esse auxílio intencional ou acidental. Fantasmas serão vistos o tempo todo na tela. Na verdade são silhuetas de outros jogadores, translúcidas, impossíveis de atingir e que não afetam diretamente em sua jogabilidade. Os fantasmas são exatas reproduções do desempenho de outros jogadores conectados. Eles balançam suas espadas, se esquivam, saltam, correm, mas não se pode ver com quem estão lutando ou o que estão enfrentando, exatamente. O que se sabe é que, se eles estão ali, isso funciona como pista para que tipo de coisa aguarda o próprio jogador de carne-e-osso.

Não é esse o único tipo de interação possível. Além das suas próprias manchas de sangue (nos locais de morte), no modo online aparecem as bloodstains dos demais jogadores. Ao ativá-las, tocando-as, vai-se testemunhar um replay instantâneo dos últimos segundos de vida do sujeito, esclarecendo o “mistério” de sua falha. Se um tal jogador atacou um inimigo da maneira “x”, pode ter sido a indicação de que a estratégia não funcionará, e quem sabe seja melhor usar a tática “y” quando chegar sua vez! Se o jogador for altruísta, ao morrer, poderá deixar uma anotação, que será lida pelos outros quando eles cruzarem com seu sangue. Não se pode criar a própria mensagem, mas selecioná-la numa lista pré-pronta, que no entanto é bastante extensa. Os sacanas logo pensarão em atrapalhar os outros jogadores mentindo ou criando qualquer tipo de boato infundado. Vá por mim: existem outras formas de estragar a jogatina alheia! As runas com anotações serão avaliadas. Mensagens mal-avaliadas logo desaparecem, mas as mais populares e aceitas permanecerão por muito tempo nesses mundos eternamente cambiantes. Escritor e leitor não estão obrigados a se ajudar mutuamente, mas não é raro que uma mão lave a outra, e todos lucrem mediante tais atitudes.

Para quem pensa que esgotei a descrição do modo internet, ainda falta a forma mais direta de colaboração: em quests cooperativas, mas que óbvio! A ferramenta é incrivelmente imaginativa. Os jogadores estão em duas formas: carnal e espiritual. O guerreiro de carne tem 100% de HP; o fantasma, genericamente 50% (há, contudo, um anel que pode turbinar essas estatísticas). Sempre se começa na forma carnal e, adivinhe só, migra-se para a forma fantasmagórica assim que se morre pela primeira vez. A forma carnal pode ser recuperada ao se derrotar um chefe de fase ou encontrar uma pedra especial. Como não é uma ocasião das mais comuns, peregrinar como alma penada é o mais usual. Toda alma pode espalhar marcadores espirituais pelas fases, que, quando vistas e acionadas por outros jogadores da rede, convocam a respectiva alma para que lutem juntos, no mundo de quem fez a convocação (desnecessário dizer que quem convocou a alma precisa estar vivo, com o corpo – senão seria fácil demais!). O máximo de convocações é de duas, o que significa que no máximo as bestas NPCs encararão um trio de humanos. Não é possível combinar de chamar um amigo que também jogue, pois esse recurso é completamente anônimo. Tampouco é possível conversar ou fazer alertas detalhados. Pode parecer uma grande limitação, mas é a graça do negócio, pois aumenta a mística em relação aos dias de caça e caçador de Boletaria, essa montanha russa medieval de emoções!

Um certo senso de camaradagem vai sendo construído entre essas almas e corpos sem identidade. Convocar almas parece recompensador, enquanto que ajudar jogadores em seus próprios universos tem cara de ser perda de tempo, já que não resultaria em progressos efetivos na sua própria dimensão. Essa é uma mentira parcial, pois o número de almas conquistadas ao final da parceria é dividido entre os dois ou três atores. Mas, mesmo que não houvesse esse sistema de recompensas, o simples fato de estar ativo em batalhas e testemunhando combates pode ensinar muito sobre como lidar com as feras no próprio mundo offline. Os chefes são tão difíceis que será sempre bom tentar vencê-los online, exceção feita para o primeiro de todos, que realmente não prepara ninguém para os devoradores-de-homens, mordedores-de-unha e manipuladores-de-tempestade que se irá desafiar na seqüência não tão imediata. A compleição dos bosses é particularmente grotesca!

Ah, sim: é possível bancar a nêmese do ciberespaço! Assim que tiver progredido o suficiente, e sido agraciado com o item certo, será possível invadir o reino de outros jogadores na forma de fantasma negro – e ser invadido, também. E os servidores se encarregam de possibilitar invasões apenas de jogadores de níveis semi-equivalentes. Ou seja: nada de uma profusão de batalhas injustas. Como se os demônios da CPU não fossem o bastante, o jogador que escolher viver num inferno na terra (uma porção mais infernal do inferno!) conviverá com sensações ambivalentes. Uma frase na tela avisa que seu reino acaba de ser penetrado por um humano com más intenções. A tensão tomará conta, cada passo será dado com o triplo de cautela: será que seu personagem está sendo visto, seguido nesse exato momento? Ou o rival espera em um ponto específico, como uma ponte ou uma esquina? Invadir o reino dos outros também desperta aquele capeta dentro de si, dá um pouco de auto-estima e sentimento de poder. São encontros sempre engraçados (ainda bem que estamos ilesos na poltrona), empolgantes e instrutivos! O fenomenal é que várias dessas engines podem se mesclar. Um exemplo é quando, como fantasma, você coopera com outro, indo ao seu mundo espancar umas crias do cruz-credo, quando de repente um fantasma negro aparece na frente da dupla entrosada! São encontros entre 3 (ou 4, lembre-se que se pode estar em três do mesmo lado!) jogadores de qualquer parte do globo! Banir fantasmas invasores do mundo dos outros parece tão gratificante quanto bani-los do seu próprio realm!

O sistema de miras poderia ter sido melhorado antes do lançamento, assim como a câmera é pior nessas ocasiões. Imagine-se enfrentando múltiplos gárgulas enquanto sobe uma escada estreita: não há morte mais penosa do que as quedas em abismos! Em algumas pequenas porções das fases acontecem slowdowns. Tais falhas explicam o porquê de um game eleito o melhor do ano de 2009 não receber sequer um 9, mas que os gamers não pensem que a nota se explica pelo nível de dificuldade: aqueles que não gostam de sofrer e suar um pouco enquanto na frente da TV simplesmente não devem procurar o produto, mas pelo menos aceitem que tal característica não é – se não fugir ao controle –, em si, um empecilho nem uma vantagem em qualquer contexto.

Agradecimentos a Kevin VanOrd

Por Rafael de Araújo Aguiar

versão 3 – escrito em 2012, revisado em 2021, atualizado em 2023.

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